A Bíblia tem esse nome a partir do latim Biblia (“livro” ou “livros”), e que deriva do grego Ta Biblia (“os livros”), referido à cidade portuária fenícia de Gebal, conhecida como Byblos pelos gregos. A escrita tornou-se associada a Byblos como exportadora de papiros (usados para se escrever) e o nome grego para papiro era bublos.
Embora a Bíblia seja considerada como um trabalho único, coeso, realmente é uma antologia de antigos escritos realizados por muitos autores diferentes durante muitos séculos, reunidos em um único livro. Ela contém poesia, narrativas de temas religiosos, reflexões filosóficas como no Livro do Eclesiastes, cartas e a apocalíptica obra-prima conhecida como Livro da Revelação.
O fio condutor comum a todos estes trabalhos colecionados é a existência de uma todo poderosa deidade que é a criadora do Universo e possui um interesse na vida pessoal e no destino final dos seres humanos. Os livros da Bíblia Cristã foram reunidos em uma sequência que relata a história da criação do mundo por uma deidade suprema, a perda do Paraíso pelo homem e a redenção da humanidade pelo Filho de Deus. Porém os livros não foram escritos nesta sequência e nem poderiam os trabalhos dos autores originais do Antigo Testamento terem em mente aquela história particular.
A Bíblia do judaísmo (reunida e autorizada por volta do século III a.C.) contém a Torá (os cinco primeiros livros da Bíblia) e a Tanakh (as histórias dos juízes e profetas) e não faz menção a Jesus Cristo. O Deus da Bíblia nestes livros é o Deus do Judaísmo – uma deidade única e todo-poderosa – e, antes da apropriação das escrituras hebraicas pelo Cristianismo Primitivo, as narrativas que compõem a Bíblia relatam o cuidado de Deus e Sua intervenção nos assuntos dos israelitas do Oriente Médio.
Estrutura da Bíblia
No judaísmo, as escrituras são chamadas Tanakh e compreendem 24 livros divididos em três categorias: o Pentatêuco (ou Ensinamentos dos Cinco Livros de Moisés), os Profetas e os Escritos. O cristianismo, que se apropriou do Tanakh, reivindica-o como sua própria história teológica, e o denomina Antigo Testamento. Os primeiros escritores cristãos, anos após a provável data da morte de Jesus, compuseram os Evangelhos e o Livro dos Atos. Paulo, o Apóstolo, escreveu a maioria das epístolas que compõem os 27 livros do Novo Testamento Cristão e cuja teologia justifica o termo Evangelhos. O Livro da Revelação, atribuído a João de Patmos, é o último livro da Bíblia Cristã.
É difícil precisar a data da composição dos livros que constituem a Bíblia, mas os estudiosos geralmente concordam que o Pentateuco foi escrito entre os séculos X e VI a.C. e a Tanakh foi fixada como escritura bem antes do século I d.C. Os livros que compõem o Novo Testamento Cristão, ou seja, os Evangelhos foram escritos entre os anos 60-110 d.C., as Cartas entre os anos 45-130 d.C. e entre 68-100, o Livro da Revelação de São João. Muitas pessoas do mundo antigo, e mesmo atualmente, acreditam que a Bíblia tenha sido escrita por Deus. É o livro mais vendido em todo a história e influenciou mundialmente o pensamento religioso por séculos.
Sinopse e Comentário
O livro do Gênesis, o primeiro livro do Antigo Testamento, conta-nos a história da criação do Universo, o mundo e humanidade, a queda do homem no Jardim do Eden e a grande inundação que Deus enviou ao mundo devido ao mal no gênero humano. Após o Dilúvio, os filhos de Noé repovoaram a terra e a narrativa prossegue com as histórias de seus descendentes, os ancestrais dos hebreus que escreveram a narrativa. O conto de José e seu paletó de muitas cores leva os hebreus de sua terra, Canaã, para o Egito onde, o Livro do Êxodo explica, tornaram-se escravos.
Eles saíram do Egito para a liberdade pelo grande legislador Moisés, que, em seguida, passou a liderança a seu subcomandante Josué, filho de Nun, cujo exército devastou a região de Canaã, onde os hebreus puderam reivindicar como a terra prometida a eles pelo Deus deles (conforme relatado nos Livros de Josué e Números). Após a fixação dos povo que se autodenominaram israelitas na região, reis famosos como David e seu filho Salomão governaram e grandes profetas como Jeremias e Isaias, Ezequiel e Jonas pregaram a vontade do Deus deles.
O Novo Testamento dedica-se à vida e ensinamentos de Jesus Cristo, o filho de Deus enviado para redimir a humanidade do pecado. Jesus nasceu da Virgem Maria e começou seu ministério, pregando uma relação direta e pessoal com Deus, quando tinha aproximadamente 30 anos. Ele foi traído por um de seus seguidores e crucificado pelos romanos por incitar sedição. Três dias após sua morte, ergueu-se do túmulo e ascendeu aos Céus para governar à direita de Deus, o Pai. Neste local, ele enviou o Espírito Santo que, a partir de então, cuidaria dos crentes na Terra. O Novo Testamento termina com a visão do fim do mundo, relatado por João de Patmos.
O primeiro dos quatro livros (Mateus. Marcos, Lucas e João) muitas vezes são considerados como testemunhas oculares do ministério de Jesus na Terra, mas na verdade não o são. A prática de se escrever sob o nome de uma pessoa famosa ou, pelo menos, atribuir que alguém escreveu para outra pessoa mais conhecida, estava bem implantada na época em que os Evangelhos foram escritos e é provável que os autores tenham escolhido os nomes de pessoas que eram bastante respeitadas na comunidade cristã, para se conseguir uma ampla aceitação do material.
Existem boas razões para se acreditar que as narrativas dos Evangelhos (as incluídas na Bíblia e as rejeitadas) são exemplos de um gênero literário conhecido como Literatura Naru Mesopotâmica, na qual alguma grande figura histórica (em geral um rei) é retratado em um conto ficcional. No caso dos Evangelhos, foi sugerido, que pode ter havido uma figura histórica como Jesus de Nazaré, que inspirou histórias e lendas, porém os fatos da vida daquela pessoa são obscurecidos pelo gênero em que foram escritos, com foco em divulgar uma verdade cultural ou espiritual, não relacionada a uma história.
Como os Evangelhos precederam os Atos dos Apóstolos e as Cartas de Paulo no Novo Testamento, muitas pessoas parecem acreditar que essas obras foram escritas primeiro e os eventos relatados aconteceram antes dos últimos livros; na verdade, o inverso é verdadeiro. As Cartas de Paulo vieram primeiro e os Evangelhos foram escritos mais tarde. A visão de Paulo, de fato, justifica todos os quatro Evangelhos na Bíblia, bem como o Livro dos Atos.
Entre 42-62 d.C., Paulo o Apóstolo viajou por todo o Mediterrâneo em suas missões evangélicas, pregando a nova religião da ascensão de Cristo. A própria Bíblia, no Livro dos Atos e I Pedro alude à possibilidade, explorada em profundidade no final do século XIX e princípio do XX, de que a versão de Paulo do cristianismo foi diferente da mensagem pregada por Jesus de Nazaré. Paulo (anteriormente Saulo) de Tarso, era um judeu fariseu de Tarso (atualmente na Turquia) que afirmava ter recebido uma visão de Deus que o convenceu da realidade de Jesus Cristo como o filho criador do Universo enviado à Terra para morrer pelos pecados dos homens.
Muitas pessoas, desde então, consideraram isto como uma ocorrência miraculosa que mostra o amor de Deus pela humanidade, por meio do sacrifício de seu filho. O conceito de morrer e ressuscitar a figura de um deus já era bem conhecido na época de Paulo e é provável que tais crenças, como o culto de Isis, formaram as bases das visões religiosas de Paulo. A compreensão da Bíblia entre a elevação de Constantino I ao cristianismo (que viria a se tornar a religião de Roma nos IV e V séculos d.C.) e as próximas centenas de anos permaneceu relativamente inalterada até a Reforma Protestante no século XVI, mas, no século XIX, a interpretação da Bíblia sofreu uma reforma radical.
Compreensão da Bíblia e a Arqueologia do Século XIX
As histórias que a Bíblia relata foram consideradas historicamente corretas e inteiramente únicas até a metade do século XIX quando arqueologistas descobriram a civilização da Mesopotâmia e do Egito. A Bíblia, de fato, era considerada como o livro mais antigo no mundo até a descoberta de uma literatura muito mais antiga e que relatava as mesmas histórias, de uma forma mais anterior, do que aquelas encontradas na Bíblia. Os estudiosos há muito sabiam que a Bíblia era uma compilação que havia sido reunida a partir de trabalhos anteriores e autorizada pelos Bispos de Roma, porém ninguém pareceu estar atento de que aquelas obras foram retiradas de peças muito mais antigas. Ninguém podia ler os hieroglifos egípcios até Jean Jacques Champolliom (*1790 +1832) decifrá-los, bem como a literatura da Suméria se encontrava completamente desconhecida para o mundo moderno.
Na metade do século XIX museus e publicações enviaram arqueologistas do ocidente para a região da Mesopotâmia para encontrar evidência física que poderia confirmar as narrativas bíblicas. O século XIX constitui um interessante período para a religião no Ocidente, especialmente o cristianismo, pois as pessoas passaram a expor suas críticas à fé e novas ideias e filosofias apresentavam alternativas aceitáveis para a crença religiosa. O livro de Charles Darwin, A Respeito da Origem das Espécies por Meio da Seleção Natural foi publicado em 1859 e desafiou a crença segura na criação da humanidade por um Deus todo-poderoso.
A Bíblia diz que Deus fez o homem “um pouco inferior aos anjos” (Salmo 8:5), enquanto Darwin dizia que os humanos evoluíram a partir de espécies inferiores. Em 1822, o filósofo alemão Nietzzche publicou sua obra A Gaia Ciência, com o famoso argumento “Deus está morto - e nós o matamos.” A linha de Nietzche é quase sempre tomada fora do contexto como um desafiador repúdio da religião, mas, na verdade, ele somente se referia a que os avanços nos conhecimentos e na tecnologia por todo o século XIX, haviam tornado obsoleto o conceito de Deus. Parcialmente em resposta a tais afirmativas, museus e, principalmente, sociedades cristãs do ocidente enviaram grupos de arqueologistas à Mesopotâmia para encontrarem evidências da verdade da Bíblia.
Ao contrário, o que descobriram foi a antiga civilização da Mesopotâmia e a rica herança literária que se encontrava, durante século, enterrada sob as areias. Histórias icônicas como a Queda do Homem e a Grande Inundação, que foram encontradas, não eram únicas para a Bíblia e quase tudo já havia sido escrito muitos séculos antes que os escribas hebreus as atualizassem no seus próprio trabalho. O grande código de leis de Moisés, que se imaginava ser o primeiro na história, descobriu-se que tinha um predecessor no Código de Ur-Nammu e no mais famoso Código de Hammurabi.
Enquanto isso, escavações no Egito não encontraram nenhuma evidência para a história da escravidão dos hebreus sob o faraó do Egito, nem quaisquer outros detalhes encontrados no Livro do Êxodus. Uma vez decifrados os hieroglifos, os mitos do Egito mostraram similaridades à figura cristã do Deus que morre e revive e Maria, Mãe de Jesus, com diversos atributos e epítetos da deus egípcia Isis. Como as histórias destas descobertas tornaram-se amplamente divulgadas, a crença na Bíblia como a palavra de Deus começou a mudar para um entendimento do trabalho como inspirado por Deus ou como a escritura escrita por homens inspirados.
Conclusão
Embora muitas pessoas pelo mundo todo atualmente continuem a acreditar na Bíblia como uma palavra de Deus, esta crença não está tão disseminada como era antes do século XIX. A interpretação da Bíblia atualmente é amplamente uma matéria de compreensão individual, sem a expectativa social que instruía a sociedade ocidental antes dos trabalhos dos estudiosos, arqueologistas e historiadores do século XIX.
Estes indivíduos mudaram o mundo pela revisão radical do entendimento do povo a respeito da história e da Bíblia e abriram avenidas de pesquisa as quais muito ampliaram o conhecimento humano. O entendimento revisado da Bíblia e seu lugar na história irritou muitas pessoas naquela época e atualmente, porém, para muitos outros, a beleza da linguagem bíblica e a grandiosa visão da redenção não foi diminuída pelas revelações dos revisionistas do século XIX. A Bíblia continua a inspirar e encorajar as pessoas em todo o mundo, traduzida em todas as línguas e permanece o livro mais vendido de todos os tempos.