A Mesopotâmia (termo originário do grego, significando “entre dois rios”) era uma antiga região situada no Mediterrâneo oriental, limitada a nordeste pelas Montanhas Zagros e a sudoeste pelo Planalto Árabe, correspondendo ao atual Iraque e partes do Irã, Síria, Kuwait e Turquia e conhecida como o Crescente Fértil e o berço da civilização.
Os “dois rios” do nome referem-se ao Tigre e o Eufrates, e a região ficou conhecida como “Al-Jazirah” (a ilha) pelos árabes, ou seja, uma terra fértil circundada pela água. O egiptólogo J. H. Beasted (v. 1865-1935) cunhou o termo “Crescente Fértil” em 1916 para descrever a área na extremidade norte do Golfo Pérsico, associada com o Jardim do Éden bíblico.
A Mesopotâmia abrigou muitas civilizações diferentes ao longo de milhares de anos, as quais contribuíram de forma significativa para a cultura e progresso mundiais. Muitos dos aspectos da vida cotidiana que nos passam despercebidos nos dias atuais, como a escrita, a roda, códigos legais, a vela de navegação, o conceito de um dia de 24 horas, fermentação da cerveja, direitos civis e a irrigação agrícola foram desenvolvidos inicialmente na terra entre dois rios, que se tornou o lar de grandes civilizações.
O Berço da Civilização
Ao contrário de civilizações mais unificadas, como as do Egito ou Grécia, a Mesopotâmia abrangeu culturas variadas, cujos laços básicos resumiam-se à escrita, aos deuses que cultuavam e à atitude sobre as mulheres. Os costumes sociais, leis e mesmo o idioma do povo sumério são diferentes do Período Acadiano, e não se pode presumir que correspondiam àqueles das civilizações babilônicas; parece, no entanto, que os direitos das mulheres (durante algumas épocas), a importância da escrita e o panteão dos deuses foram de fato compartilhados através da região, ainda que as divindades tivessem diferentes nomes de acordo com a época ou local.
Como resultado disso, a Mesopotâmia deve ser compreendida mais apropriadamente como uma região que produziu impérios e civilizações múltiplos, em vez de uma única civilização. Ainda assim, a Mesopotâmia tornou-se conhecida como o “berço da civilização” principalmente por causa de dois desenvolvimentos que ocorreram na região da Suméria, no quarto milênio a.C.:
- A ascensão da cidade tal como a conhecemos hoje.
- A invenção da escrita (embora se saiba que a escrita foi igualmente desenvolvida no Egito, no Vale do Indo, na China, e que surgiu de forma independente na Mesoamérica).
A invenção da roda também costuma ser creditada aos mesopotâmicos e, em 1922, o arqueólogo Sir Leonard Wooley descobriu "os remanescentes de duas carroças com quatro rodas [no sítio da antiga cidade de Ur], os mais antigos veículos com rodas descobertos na história, junto com seus pneus de couro" (Bertman, 35). Outros importantes desenvolvimentos e invenções creditados aos mesopotâmicos incluem, para citar apenas alguns exemplos, a domesticação de animais; agricultura e irrigação; ferramentas comuns; armamento e táticas militares sofisticadas; o carro de guerra; vinho; cerveja; a demarcação do tempo em horas, minutos e segundos; ritos religiosos; a vela (barcos movidos a vela); e códigos legais. O orientalista Samuel Noah Kramer, de fato, listou 39 "primeiros" na civilização humana que se originaram na Suméria. Eles incluem:
As Primeiras Escolas, o Primeiro Caso de Bajulação, o Primeiro Caso de Delinquência Juvenil, a Primeira “Guerra de Nervos”, o Primeiro Congresso Bicameral, o Primeiro Historiador, o Primeiro Caso de Redução de Impostos, o Primeiro “Moisés”, o Primeiro Precedente Legal, a Primeira Farmacopeia, o Primeiro “Almanaque do Fazendeiro”, o Primeiro Experimento em Jardinagem com Árvores de Sombra, a Primeira Cosmogonia e Cosmologia Humanas, os Primeiros Ideais Morais, o Primeiro “Emprego”, os Primeiros Provérbios e Ditos, as Primeiras Fábulas com Animais, os Primeiros Debates Literários, os Primeiros Paralelos Bíblicos, o Primeiro “Noé”, o Primeiro Conto de Ressurreição, o Primeiro “São Jorge”, o Primeiro Caso de Empréstimo de Livros, a Primeira Era Heroica do Homem, a Primeira Canção de Amor, o Primeiro Catálogo de Biblioteca, a Primeira Era de Ouro Humana, a Primeira Sociedade “Doente”, os Primeiros Lamentos Litúrgicos, os Primeiros Messias, o Primeiro Campeão de Longa Distância, a Primeira Imagem Literária, o Primeiro Simbolismo Sexual, a Primeira Virgem Maria, a Primeira Canção de Ninar, o Primeiro Retrato Literário, as Primeiras Elegias, a Primeira Vitória dos Trabalhadores e o Primeiro Aquário.
As escavações arqueológicas iniciadas na década de 1840 revelaram povoações humanas na Mesopotâmia que datam desde 10.000 a.C., indicando que as condições férteis da terra entre os dois rios permitiu o assentamento dos povos caçadores-coletores na região, a domesticação de animais, atividades agrícolas e o desenvolvimento da irrigação. O comércio logo se seguiu e, com a prosperidade, veio a urbanização e o nascimento da cidade. De maneira geral, acredita-se que a escrita surgiu graças ao comércio, a necessidade de comunicação de longa distância e a manutenção de um registro mais cuidadoso das contas.
Conhecimento e Religião
A Mesopotâmia ficou conhecida na antiguidade como local de aprendizado, e acredita-se que Tales de Mileto (v. c. 585 a.C., conhecido como o “primeiro filósofo”) a tenha visitado. Como os babilônicos acreditavam que a água era o “primeiro princípio”, do qual tudo o mais surgiu, e como Tales tornou-se famoso por esta afirmação, parece provável que tenha estudado na região.
Os estudos intelectuais eram altamente valorizados por toda a Mesopotâmia e as escolas (dedicadas principalmente à classe sacerdotal) seriam tão numerosas quanto os templos, ensinando a leitura, escrita, religião, direito, medicina e astrologia. Havia mais de 1.000 divindades no panteão das culturas mesopotâmicas e muitas lendas referentes a eles (entre as quais o mito da criação, chamado Enuma Elish). É geralmente aceito que relatos bíblicos, tais como a Queda do Homem e o Grande Dilúvio (entre muitos outros) originaram-se da tradição mesopotâmica, já que aparecem em obras como O Mito de Adapa e o Épico de Gilgamesh, a mais antiga história escrita do mundo. Os mesopotâmicos acreditavam na atuação em conjunto com os deuses e que a terra se encontrava imbuída com espíritos e demônios (ainda que estes “demônios” não devam ser entendidos segundo a concepção moderna e cristã).
O início do mundo, segundo sua crença, era uma vitória dos deuses sobre as forças do caos mas, mesmo que tivessem vencido, isso não significava que o caos não pudesse retornar. Através de rituais diários, atenção às divindades, práticas funerárias adequadas e simples responsabilidade cívica, o povo da Mesopotâmia achava que contribuía para manter o equilíbrio do mundo e afastar as forças do caos e da destruição. Além de respeitar os mais velhos e tratar as pessoas com respeito, os cidadãos também honravam os deuses por intermédio das atividades que realizavam todos os dias.
Ocupações
Tanto homens quanto mulheres trabalhavam e “porque a antiga Mesopotâmia era fundamentalmente uma sociedade agrária, as principais ocupações consistiam em cultivar a terra e a criação de animais” (Bertman, 274). Outras ocupações incluíam as dos escribas, o curandeiro, artesão, tecelão, ceramista, sapateiro, pescador, professor e sacerdote ou sacerdotisa. Bertman afirma:
No topo da sociedade estavam os reis e sacerdotes, servidos por grandes equipes nos palácios e templos. Com a instituição dos exércitos permanentes e a disseminação do imperialismo, oficiais militares e soldados profissionais passaram a fazer parte da crescente força de trabalho da Mesopotâmia. (274)
As mulheres desfrutavam de direitos quase iguais e podiam possuir terras, pedir divórcio, ter seus próprios negócios e firmar contratos comerciais. Contratos, acordos de negócios e correspondências eram escritos em cuneiforme nas tabuinhas de argila e assinados com a impressão do selo cilíndrico de uma pessoa, que servia como forma de identificação. Uma vez que a tabuinha secasse, podia ser colocada dentro de um envelope de argila, por sua vez selado novamente, de forma que somente o destinatário poderia ler a carta ou contrato. A escrita cuneiforme foi usada para redigir linguagens semíticas, tais como o babilônio ou outras, como o sumério, e permaneceu em uso até a substituição pela escrita alfabética. Os recibos de mercadorias também eram feitos em tabuinhas de cuneiforme (como tudo o mais, incluindo a literatura) e estas duraram muito mais tempo do que os documentos redigidos em papiro ou papel.
O mais antigo recibo de cerveja do mundo vem da Mesopotâmia, conhecido como o Recibo Alulu (c. 2050 a.C.), elaborado na cidade de Ur. Inicialmente, as mulheres foram as mais antigas fabricantes de cerveja e vinho, bem como as curandeiras da comunidade. Estas profissões, mais tarde, passaram para os homens, quando se tornou evidente seu aspecto lucrativo. O trabalho que alguém fazia, porém, nunca era considerado simplesmente um “emprego”, mas uma contribuição para a comunidade e, por extensão, para os esforços divinos de manutenção do mundo em paz e harmonia.
Construções e Governo
O templo, situado no centro de cada cidade (conhecido como zigurate, uma estrutura piramidal em degraus nativa da região), simbolizava a importância do patrono divino, que também passaria a ser venerado por quaisquer comunidades controladas por ela. Cada cidade tinha seu próprio zigurate (cujo tamanho refletia sua importância) para venerar seu patrono. A Mesopotâmia viu nascer as primeiras cidades do mundo conhecidas pela história, em grande parte construídas com tijolos secados ao sol. Nas palavras de Bertman:
A arquitetura doméstica da Mesopotâmia cresceu a partir do solo onde se situava. Diferente do Egito, a Mesopotâmia – especialmente ao sul – dispunha de poucas pedreiras que pudessem ser exploradas para construção. A região tampouco tinha árvores para madeira, de forma que o povo se voltou para outros recursos naturais que se encontravam abundantemente à mão: a argila lamacenta das margens dos rios e os juncos e caniços que cresciam nos pântanos. Com eles, os mesopotâmicos criaram as primeiras colunas, arcos e estruturas cobertas do mundo. (285)
As casas mais simples eram construídas a partir de maços de caniços amarrados e inseridos no solo, enquanto as mais complexas requeriam tijolos de argila secados ao sol (uma prática seguida mais tarde pelos egípcios). Para os complexos urbanos e de templos, com seus famosos zigurates, utilizavam-se tijolos de argila cozidos em fornos e posteriormente pintados.
Pensava-se que os deuses estavam presentes no planejamento e execução de quaisquer projetos de construção. Assim, orações específicas, recitadas numa ordem preestabelecida para a divindade apropriada, eram consideradas como de importância fundamental para o sucesso da iniciativa e a prosperidade dos seus ocupantes.
Sejam quais fossem os reinos ou impérios que se elevassem através da Mesopotâmia, em qualquer período histórico, o papel vital dos deuses nas vidas da população permanecia intocável. A reverência pelo divino caracterizava as vidas tanto dos trabalhadores do campo quanto do rei. A historiadora Helen Chapin Metz escreve:
A precariedade da existência na Mesopotâmia meridional levou a um senso religioso altamente desenvolvido. Locais de culto como Eridu, existentes desde 5000 a.C., serviam como importantes centros de peregrinação e devoção, mesmo antes da ascensão da Suméria. Muitas das mais importantes cidades mesopotâmicas emergiram em áreas que circundavam estes centros de culto pré-sumerianos, desta forma reforçando o estreito relacionamento entre religião e governo. (2)
A realeza foi estabelecida em algum ponto após 3600 a.C. e, ao contrário dos governantes-sacerdotes que vieram antes, o rei lidava diretamente com o povo e deixava sua vontade clara através de leis de sua própria autoria. Antes do conceito da realeza, acredita-se que os governantes sacerdotais ditavam a lei conforme preceitos religiosos e recebiam mensagens divinas através de sinais e presságios; o rei, ainda que honrando e aplacando os deuses, tornava-se um representante destas divindades poderoso o suficiente para ser capaz de declarar sua vontade conforme seus próprios ditames e usando sua própria voz.
Isso é mais claramente observado no famoso Código de Hamurabi da Babilônia (r. 1792-1750 a.C.), mas um governante alegando contato direto com os deuses era bastante comum por toda a história da Mesopotâmia, mais notavelmente no rei acadiano Naram-Sin (r. 2261-2224 a.C.), que chegou ao ponto de se proclamar como um deus encarnado. O rei responsabilizava-se pelo bem-estar de seu povo e um bom soberano - que governasse de acordo com a vontade divina - recebia o reconhecimento através da prosperidade da região na qual reinava.
Ainda assim, mesmo governantes muito eficientes, como Sargão da Acádia (r. 2334-2279 a.C.) precisavam lidar com perpétuas insurreições e revoltas de facções ou de regiões inteiras que contestavam sua legitimidade. Como a Mesopotâmia abrigava tantas culturas e etnicidades diferentes dentro de suas vastas fronteiras, um único governante tentando aplicar as leis de um governo central encontraria invariavelmente resistência de alguma forma.
A História da Mesopotâmia
A história e o desenvolvimento das civilizações que floresceram na Mesopotâmia é mais facilmente compreendida pela divisão em períodos:
Era Neolítica Pré-Cerâmica
Também conhecida como Idade da Pedra (c. 10000 a.C., embora haja evidências muito anteriores que sugerem habitação humana). Existem confirmações arqueológicas de povoações simples e indícios de conflitos antigos entre tribos, provavelmente disputas envolvendo terras férteis para cultivo e campos para criação de animais. A zootecnia vinha sendo praticada com intensidade cada vez maior durante esta época, devido à mudança da cultura de caçadores-coletores para uma sedentária e agrária. Mesmo assim, o historiador Marc Van De Mieroop observa:
Não houve a transformação súbita dos caçadores-coletores em fazendeiros, mas antes um processo lento durante o qual o povo confiava cada vez mais nos recursos que administrava diretamente, mas ainda suplementava sua dieta com a caça de animais selvagens. A agricultura permitiu um aumento nos assentamentos permanentes. (12)
À medida que novos povoados cresciam, os desenvolvimentos arquitetônicos lentamente se tornaram mais sofisticados, graças à construção de habitações permanentes.
Era Neolítica de Cerâmica (c. 7000 a.C.)
Neste período houve ampla disseminação do uso de ferramentas e potes de argila e uma cultura específica começou a emergir no Crescente Fértil. O estudioso Stephen Bertman afirma que “durante esta era, a única tecnologia a avançar foi literalmente a ‘de ponta’, pois as ferramentas de pedra e armas se tornaram mais sofisticadas”. Bertman observa ainda que “a economia neolítica baseou-se principalmente na produção de alimentos através da cultivo e criação de animais” (55), com mais estabilidade, em oposição à Idade da Pedra, na qual as comunidades eram mais móveis. Os avanços arquitetônicos naturalmente se seguiram no rastro das povoações permanentes, assim como desenvolvimentos na fabricação de cerâmicas e ferramentas de pedra.
Idade do Cobre (5900 – 3200 a.C.)
Também conhecido como Período Calcolítico, devido à transição das ferramentas e armas de pedra para as feitas de cobre. Esta era inclui o assim chamado Período Ubaid (c. 5000 – 4100 a.C., que recebeu seu nome do Tell al-Ubaid, local do Iraque onde se descobriu o maior número de artefatos), durante o qual ergueram-se os primeiros templos mesopotâmicos e vilarejos sem muros desenvolveram-se a partir dos povoados esporádicos de habitações simples. Estes vilarejos então deram origem ao processo de urbanização, durante o Período Uruk (4100-2900 a.C.), quando surgiram as cidades, mais notavelmente na região da Suméria, incluindo Eridu, Uruk, Ur, Kish, Nuzi, Lagash, Nipur e Ningirsu, e em Elam, com a cidade de Susa.
Com frequência cita-se Uruk como a cidade mais antiga, embora Eridu e Ur também fossem sugeridas. Van de Mieroop afirma que "a Mesopotâmia foi a região mais densamente povoada do mundo antigo" (como citado em Bertman, 201) e as cidades que cresceram ao longo dos rios Tigre e Eufrates, bem como aquelas mais distantes, estabeleceram sistemas comerciais que resultaram em grande prosperidade.
Este período viu as invenções da roda (c. 3500 a.C.) e da escrita (c. 3600 a.C.), ambas pelos sumérios, o estabelecimento de reinos para substituir o governo sacerdotal e a primeira guerra registrada do mundo, entre os reinos da Suméria e de Elam (2700 a.C.), com a vitória do primeiro. Durante o Período Dinástico Inicial (2900-2334 a.C.), todos os avanços do Período Uruk foram desenvolvidos e as cidades, além do governo em geral, estabilizaram-se.
A crescente prosperidade na região permitiu a criação de templos e estatuária decorados, cerâmica e figurinhas sofisticadas, brinquedos para crianças (incluindo bonecas para meninas e carrinhos com rodas para os meninos) e o uso de selos personalizados (conhecidos como Selos Cilíndricos) para denotar a posse de propriedade e para garantir a assinatura dos indivíduos. Os Selos Cilíndricos seriam comparáveis aos modernos cartões de identificação ou carteiras de motorista e, de fato, a perda ou furto deles teria tanto significado quando o furto de documentos ou a perda de cartões de crédito nos dias atuais.
Idade do Bronze Inicial (3000 – 2119 a.C.)
Durante este período, o bronze suplantou o cobre como matéria-prima para ferramentas e armas. A ascensão da cidade-estado lançou os alicerces da estabilidade econômica e política que eventualmente levou ao surgimento do Império Acadiano (2334-2218 a.C.) e o rápido crescimento de povoados como Acad e Mari, dois dos mais prósperos centros urbanos da época. A estabilidade cultural necessária para a criação da arte na região resultou em projetos mais intrincados na arquitetura e escultura, bem como as seguintes invenções ou aperfeiçoamentos:
[...] várias invenções específicas e importantes: o arado e a roda, o carro de guerra e o barco a vela, e o selo cilíndrico, a mais distinta forma de arte da antiga Mesopotâmia e uma evidente demonstração da importância da posse de propriedades e dos negócios na vida cotidiana do país. (Bertman, 55-56)
O Império Acadiano de Sargão, o Grande, foi o primeiro reino multinacional no mundo e a filha deste, Enheduana (v. 2285-2250 a.C.), a primeira autora de obras literárias conhecida pelo nome. A biblioteca de Mari continha mais de 20.000 tabuinhas de cuneiforme (livros) e seu palácio ficou famoso como um dos mais belos da região.
Idade do Bronze Média (2119-1700 a.C.)
A expansão dos reinos assírios (Assur, Nimrud, Dur-Sharrukin e Nínive) e a ascensão da Dinastia Babilônica (concentrada na Babilônia e na região da Caldeia) criou uma atmosfera favorável ao comércio e, com ele, o aumento dos conflitos militares. A tribo guti, nômades ferozes que tiveram sucesso em derrubar o Império Acadiano, dominaram a política da Mesopotâmia até que acabaram derrotados pelas forças aliadas dos reis da Suméria.
Hamurabi (r. 1792-1750 a.C.), o rei da Babilônia, ascendeu da relativa obscuridade para conquistar a região e reinar por 43 anos. Entre suas muitas realizações está o famoso código de leis inscrito na estela dos deuses. A Babilônia tornou-se um centro dominante nesta época para os estudos intelectuais e de grandes realizações nas artes e letras. Esta relevância cultural não duraria muito, e a cidade foi saqueada e pilhada pelos hititas, por sua vez sucedidos pelos cassitas.
Idade do Bronze Tardia (1700-1100 a.C.)
O surgimento da Dinastia Cassita (uma tribo proveniente das Montanhas Zagros, ao norte, e que teria surgido originalmente no atual Irã) levou à transferência do poder e à expansão da cultura e do aprendizado após a conquista da Babilônia. O colapso da Idade do Bronze seguiu-se à descoberta da extração de minério e a fabricação do ferro, uma tecnologia que os cassitas e, antes deles, os hititas, fizeram amplo uso na arte da guerra.
O período também viu o declínio da cultura babilônia, devido à ascensão do poder dos cassitas, até que eles foram derrotados pelos elamitas e expulsos. Após elamitas darem vez aos arameus, o pequeno Reino da Assíria começou uma série de campanhas vitoriosas e o Império Assírio foi estabelecido e prosperou sob o governo firme de Tiglat-Pileser (r. 1115-1076 a.C.) e, depois dele, Assurnasirpal II (r. 884-859 a.C.), que consolidou ainda mais suas fronteiras. A maior parte dos estados mesopotâmicos foi destruída ou enfraquecida em seguida ao Colapso da Idade do Bronze, por volta de 1250-1150 a.C., que conduziu a uma breve "idade das trevas".
Idade do Ferro (1000-500 a.C.)
Esta era viu o surgimento e expansão do Império Neoassírio, sob Tiglat-Pileser III (r. 745-727 a.C.) e a ascensão meteórica ao poder e conquista sob o domínio de grandes reis assírios, tais como Sargão II (r. 722-705 a.C.), Senaqueribe (r. 705-681 a.C.), Assaradon (r. 681-669 a.C.) e Assurbanipal (r. c. 668-627 a.C., que conquistou a Babilônia, Síria, Israel e Egito). O império sofreu um declínio tão rápido quanto sua ascensão, devido aos ataques repetidos às principais cidades realizados pelos babilônicos, medos e cítios, em 612 a.C.
As tribos dos hititas e mitanis consolidaram seus domínios respectivos durante este período, do qual resultou a ascensão dos Impérios Neo-Hitita e Neobabilônico. O rei Nabucodonosor II (r. 605/604-562) da Babilônia destruiu Jerusalém (588 a.C.) nesta época e forçou os habitantes de Israel ao “Exílio Babilônico”. Também foi responsável por extensas construções na Babilônia, criando famosos prédios, como o Portão de Isthar e o Grande Zigurate (a “Torre de Babel”). A queda da Babilônia para Ciro II da Pérsia (O Grande, r. c. 550-530 a.C.), em 539 a.C., efetivamente pôs um fim na cultura babilônica.
Antiguidade Clássica (500 a.C. - século VII d.C.)
Após a conquista da Babilônia por Ciro II, a maior parte da Mesopotâmia tornou-se parte do Império Aquemênida Persa, o que resultou em mudanças culturais repentinas, das quais a mais notável foi extinção da escrita cuneiforme. Com a tomada da Babilônia por Alexandre, o Grande, em 331 a.C., veio a helenização cultural e religiosa mas, ainda que o rei macedônico tenha tentado fazer da cidade um local de importância, seus dias de glória estavam agora no passado.
Após a morte de Alexandre, um de seus generais, Seleuco I Nicator (r. 305-281 a.C.) assumiu o controle e fundou o Império Selêucida (312-63 a.C.), que dominou a região até a conquista pelos partos em 63 a.C. que, por sua vez, terminaram sendo dominados pelos sassânidas, fundadores do Império Sassânida (224-651 d.C.). Os sassânidas honraram os legados das civilizações mesopotâmicas anteriores e preservaram suas contribuições.
Entre o Império Parta (247 a.C. - 224 d.C.) e os sassânidas, o Império Romano estabeleceu-se na região por volta de 198 d.C. (ainda que Roma tenha chegado anteriormente, em 116-117 d.C., mas posteriormente recuado). Os romanos aperfeiçoaram a infraestrutura de suas colônias de forma significativa, através da construção de melhores estradas e canalização, e também introduziram o Direito Romano. Ainda assim, os imperadores romanos promoviam guerras constantes com seus inimigos regionais, inicialmente os partos e depois os sassânidas, sobre o controle da área.
A antiga cultura regional, preservada pelos sassânidas, foi devastada pela conquista da Mesopotâmia pelos árabes muçulmanos no século VII d.C., que trouxe a unificação da lei, linguagem, religião e cultura sob o Islã. Mantiveram-se alguns aspectos culturais mas, como observa Bertman, “com a conquista islâmica de 651 d.C., termina a história da antiga Mesopotâmia” (58). Atualmente as grandes cidades que um dia se ergueram ao longo dos rios Tigre e Eufrates transformaram-se em outeiros em grande parte inexplorados, ou nos tijolos quebrados nas planícies áridas. A região do Crescente Fértil progressivamente definhou até dar origens a áreas desérticas, tanto devido a fatores humanos (como o excesso de uso da terra, através da exploração agrícola ou desenvolvimento urbano) quanto pelas mudanças climáticas.
Legado
O legado da Mesopotâmia persiste atualmente através de muitos dos aspectos mais básicos da vida moderna, tais como o minuto com sessenta segundos e a hora com sessenta minutos.
Helen Chapin Metz afirma:
Como o bem-estar da comunidade dependia da observação atenta dos fenômenos naturais, atividades científicas ou protocientíficas ocupavam muito do tempo dos sacerdotes. Por exemplo, os sumerianos acreditavam que cada um de seus deuses estava representado por um número. O número 60, sagrado para o deus An, era sua unidade básica de cálculo. Assim, os sessenta minutos de uma hora e a notação dos 360 graus do círculo são conceitos sumerianos. O altamente desenvolvido sistema agrícola, a irrigação eficiente e os sistemas de controle de água capacitaram a Suméria a alcançar excedentes de produção, o que também levou ao crescimento de grandes cidades. (4)
A urbanização, a roda, escrita, astronomia, matemática, energia eólica, irrigação, desenvolvimento agrícola, criação de animais e as narrativas que, eventualmente, seriam reescritas como as Escrituras Hebraicas e fornecido as bases para o Velho Testamento cristão vieram da Mesopotâmia.
Conforme já observado, Kramer lista 39 "primeiros" da Mesopotâmia em sua obra A História começa na Suméria e, ainda assim, por mais impressionantes que sejam estas inovações, as contribuições mesopotâmicas para a cultura mundial não terminam com elas. Os mesopotâmicos influenciaram as culturas do Egito e Grécia por intermédio do comércio de longa distância e difusão cultural e, através delas, impactaram os romanos, que estabeleceram o padrão para o desenvolvimento e disseminação da Civilização Ocidental. A Mesopotâmia em geral, e a Suméria especificamente, deram ao mundo alguns dos seus aspectos culturais mais duradouros e, ainda que as cidades e os grandes palácios tenham-se ido há muito, o legado continuou na era moderna.
No século XIX, arqueólogos de várias nacionalidades chegaram na Mesopotâmia para descobrir evidências que pudessem corroborar as histórias bíblicas do Velho Testamento. Na época, a Bíblia era considerada o mais velho livro do mundo e acreditava-se que as histórias encontradas em suas páginas seriam composições originais. Os arqueólogos que buscavam evidências físicas para apoiar os relatos bíblicos descobriram exatamente o oposto, uma vez que as tabuinhas antigas de argila foram descobertas e se entendeu que as marcas nelas não eram desenhos, mas uma forma de escrita.
O acadêmico e tradutor George Smith (v. 1840-1876) decifrou as tabuinhas cuneiformes em 1872, as quais revelaram as antigas civilizações da Mesopotâmia para o mundo moderno. A história do Grande Dilúvio e da Arca de Noé, a Queda do Homem, o conceito de um Jardim do Éden, mesmo as lamentações de Jó haviam sido escritas pelos mesopotâmicos séculos antes dos textos bíblicos. Uma vez que o cuneiforme pôde ser lido e o antigo mundo da Mesopotâmia abriu-se para a era moderna, a compreensão da história do mundo e de nós próprios transformou-se completamente.
A descoberta da civilização sumeriana e as histórias das tabuinhas cuneiformes estimularam uma nova liberdade de pesquisa intelectual em todas as áreas do conhecimento. Compreendia-se agora que as narrativas bíblicas não eram obras originais hebraicas; que o mundo era obviamente mais antigo do que a igreja vinha afirmando; que existiram civilizações que haviam se erguido e caído muito antes do que se pensava anteriormente; e que, se estas alegações das autoridades acadêmicas e religiosas eram falsas, talvez outras também o fossem.
O espírito de investigação no final do século XIX já vinha provocando rupturas ao desafiar os paradigmas do pensamento tradicional. Quando Smith decifrou o cuneiforme, a descoberta da cultura e religião mesopotâmicas estimulou ainda mais este processo. Nos tempos antigos, a Mesopotâmia impactou o mundo através de suas invenções, inovações e visão religiosa; atualmente, ela literalmente mudou o modo pela qual as pessoas entendiam a história e nosso papel no contínuo desenrolar da civilização humana.