César como Ditador e seu Impacto em Roma

Artigo

Donald L. Wasson
por , traduzido por Ricardo Albuquerque
publicado em 11 Dezembro 2023
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Disponível noutras línguas: Inglês, francês, espanhol

O general romano Caio Júlio César (100-44 a.C.) assumiu pela primeira vez o posto de ditador em 49 a.C., porém, uma vez que garantiu a eleição como cônsul para o ano seguinte, renunciou após 11 dias. Depois de derrotar Pompeu na Batalha de Farsália, em 48 a.C., novamente foi nomeado ditador, desta vez por um ano. Em 46 a.C., César tornou-se ditador por dez anos e, finalmente, assumiu o posto de ditador perpétuo logo antes de sua morte, no início de 44 a.C..

Julius Caesar (Facial Reconstruction)
Júlio César (Reconstituição Facial)
Arienne King (CC BY-NC-SA)

Sucesso Político e Militar

Nascido de uma família patrícia em 13 de julho de 100 a.C., César começou sua carreira política em 73 a.C., quando foi eleito para uma vaga no Colégio de Pontífices após a morte do primo de sua mãe, Caio Aurélio Cota. Depois de algum tempo como tribuno militar, ele entrou no cursus honorum (a sequência de cargos no governo romano) em 69 a.C., servindo como questor na Hispânia [Espanha] Ulterior: o posto assegurou-lhe um muito desejado assento no Senado Romano. Seguiram-se as eleições para edil em 65 a.C. e pretor em 62 a.C.. Um ano antes, em 63 a.C., foi eleito pontifex maximus, ou o sacerdote-chefe do Colégio de Pontífices. Esta posição garantiu-lhe uma residência oficial no Fórum Romano. Porém, a candidatura esbarrou em controvérsias e acusações de suborno. Em 60 a.C., formou com Cneu Pompeu (106-48 a.C.) e Marco Crasso (115-53 a.C.) uma aliança política: o Primeiro Triunvirato. A despeito da oposição dos mais conservadores optimates, César tornou-se cônsul em 59 a.C..

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César assumiu poderes emergenciais como ditador por onze dias, o suficiente para garantir a eleição para outro consulado.

Na maior parte da década seguinte, ele comandou legiões na conquista da Gália e numa tentativa de invasão à Britânia. Mesmo com a renovação de sua aliança, havia uma tensão crescente entre Pompeu e César. Pompeu invejava o sucesso e fama de César, enquanto este queria retornar à política. À medida que Pompeu se tornava o favorito de Roma, seu oponente despontava como um pária. Em 7 de janeiro de 49 a.C., foi apontado como inimigo do estado por um decreto do Senado. Três dias depois, César, com apenas uma legião, cruzou o Rubicão, iniciando desta forma a guerra civil. Dennison afirmou que, ao cruzar o rio, ele foi da legalidade para a ilegalidade e "do status de fora da lei heroico a traidor" (34). Após algumas tentativas de evitar a guerra, Pompeu eventualmente optou uma retirada apressada de Roma. César assumiu poderes emergenciais como ditador por onze dias, o suficiente para ser eleito novamente como cônsul.

Guerra Civil e Ditadura

César perseguiu o sempre elusivo Pompeu através da Europa até que finalmente, em 48 a.C., ele derrotou seu antigo aliado na Batalha de Farsália, na Grécia. Quando por fim retornou a Roma, novamente foi nomeado ditador, desta vez por um ano. Tinha levado três anos, mas César combatera e derrotara as forças republicanas de Catão, o Jovem (95-46 a.C.) na Batalha de Tapso; o exército do rei Fárnaces II do Ponto (c.95-47 a.C.); e as tropas de Sexto Pompeu, na Espanha. Desta vez, ele foi recebido com braços abertos em Roma. Era uma situação diferente, pois as pessoas cansaram-se da guerra; elas simplesmente queriam paz e saudaram César como um herói. Várias honrarias foram concedidas ao ditador: celebrou-se um triunfo romano por cada uma de suas campanhas na Gália, Ponto, Egito e África. Passou a ser chamado de libertador e de pai da pátria (pater patriae). Um novo Templo de Vênus foi inaugurado e ele agradou os cidadãos com festivais, jogos, disputas de gladiadores e peças teatrais.

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Julius Caesar and the Roman Civil War (49 - 45 BCE)
Júlio César e a Guerra Civil Romana (49-45 a.C.)
Simeon Netchev (CC BY-NC-SA)

Em setembro de 46 a.C., tornou-se novamente ditador, desta vez por dez anos. Porém, em fevereiro de 44 a.C. (um mês antes de sua morte), o Senado o designou ditador perpétuo. Esta nomeação sem precedentes levou muitos a reavaliar suas opiniões. César "acumulou uma extraordinária lista de honrarias, não poucas sem precedentes, e muitas que sugeriam que buscava um status real ou divino" (Rosenstein et al., 208). Segundo Tom Holland em sua obra Rubicão, ninguém sabia o que César planejava fazer, porque ninguém sabia como a República Romana podia ser curada das feridas provocadas pela guerra civil.

César queria os poderes de um rei, mas não o título.

À medida que os poderes de César cresciam e se tornava óbvio que ele não pretendia fazer Roma voltar à glória da velha república, como prometido, o Senado Romano decidiu rescindir alguns dos poderes concedidos. Ingenuamente ou não, a nobreza romana não imaginava que o ditador pudesse recusar mas, conforme Barry Strauss, “César não tinha intenção de jogar o jogo dos senadores” (The Death of César [A Morte de César], 31). Ele não se importava mais com as opiniões do Senado. Enquanto muitos queriam que Roma retornasse ao governo das leis, César discordava, acreditando que “somente seu gênio oferecia ao povo do império paz e prosperidade” (idem, 32).

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Na obra Masters of Command, Strauss escreveu que César queria dominar Roma e deu duas razões para ter cruzado o Rubicão:

  1. Ele estava defendendo os poderes dos tribunos, que acreditava serem os verdadeiros representantes do povo.
  2. Ele levou em conta sua honra e posição pessoal.

Ainda que tenha expandido o tamanho do Senado posteriormente, César acreditava que a instituição tinha evitado por muito tempo as reformas necessárias para Roma. Seus oponentes, os optimates, discordavam, alegando que o Senado fizera Roma “sábia e livre”. Curiosamente, apesar da falta de respeito à sua autoridade, foram os próprios senadores que concederam todas as honrarias ao ditador. César acreditava na sua própria inteligência e sentia que somente alguém com sabedoria e talento poderia iniciar as reformas necessárias. E, em sua mente, ele era este homem. César queria os poderes de um rei, mas não o título, e recusava-se a ser chamado desta forma. Apesar do título de ditador perpétuo violar a constituição romana, ele acreditava que servia ao bem comum. Seu “monopólio do poder e glória o fez uma anátema aos homens que se sentiam no direito de se considerar seus pares” (Rosenstein et al., 208).

Reformas

De acordo com Philip Freeman em sua obra Julius Caesar, em 46 a.C. César começou uma revolução que mudaria Roma para sempre. Em seu período como comandante militar, o general tinha demonstrado que não apreciava o marasmo e esta crença pode ser melhor observada no início de seu papel como ditador. Ele iniciou várias reformas cívicas e sociais, afetando quase todas as facetas da vida cotidiana da Roma antiga. Estas reformas podem tê-lo feito popular junto à população em geral, mas trouxeram pânico para muitos de seus inimigos e até a alguns de seus amigos.

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Julius Caesar
Júlio César
Georges Jansoone (CC BY-NC-SA)

Como os censos anteriores haviam resultado em números incorretos, uma das primeiras reformas foi conduzir um censo apropriado; os auditores passaram a realizar pesquisas porta-a-porta por toda a cidade. A precisão do censo era essencial; a cidade havia sido devastada pelas guerras e, além disso, por vários anos cidadãos inelegíveis para o benefício estavam recebendo grãos do estado, destinados originalmente aos cidadãos mais pobres de Roma. No final, o fornecimento de grãos foi cortado pela metade, economizando dinheiro, mas os números do novo censo chocaram o ditador, que ficou preocupado com o declínio generalizado da população da cidade. Para encorajar famílias maiores e potencialmente garantir o suprimento de homens para o exército romano, César não somente ofereceu suplementação de grãos, mas também proibiu qualquer homem romano entre as idades de 20 e 40 anos de ficar ausente da cidade por mais de três anos; naturalmente, os militares ficaram isentos desta lei.

Suetônio (c. 69 a c. 130/140 d.C.) escreveu que “na administração da justiça ele foi tanto consciencioso quanto severo” (20). Isso ficou evidente em sua relação com o Senado. Embora tivesse um profundo desdém por sua autoridade, César percebeu que precisava do Senado; ele não podia governar sozinho. Ainda que “isso significasse que as famílias tradicionalmente dominantes se tornassem uma minoria na instituição mais distinta de Roma” (Freeman, 336), ele aumentou o número de senadores para quase 900. Suetônio acreditava que César havia fortalecido o Senado. Soldados, filhos de libertos e estrangeiros que o haviam servido bem estavam entre os novos senadores.

César também aumentou o número de questores, edis e pretores. Para elevar a quantidade de profissionais de classe média, concedeu a cidadania para médicos e professores que haviam se instalado na cidade. Encorajou grandes proprietários rurais a empregar mais trabalhadores livres, tornando-se menos dependentes de trabalho escravo. Baniu os leiloeiros, coveiros, professores de esgrima, cafetões e atores de servirem como magistrados. Finalmente, ele excluiu membros de classes mais baixas de servirem como jurados. César estendeu a cidadania romana para lideranças da Gália e Espanha e estabeleceu colônias de cidadãos. Fazendeiros, artesãos especializados e outros profissionais foram convidados a se instalar na Itália, enquanto o povo desempregado das favelas romanas recebeu incentivos para se transferir para as novas colônias na Espanha, Gália, África ou Grécia. Também limpou as perigosas ruas da cidade, pois Roma há anos sofria com a violência e corrupção.

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Sua reforma mais famosa foi a do calendário. Suetônio relatou que os pontífices tinham negligenciado a questão a tal ponto que as datas da colheita e dos festivais respectivos não mais correspondiam às estações. César usou sua posição como pontifex maximus de Roma para adotar o calendário solar, substituindo o antigo calendário lunar.

Entre as demais reformas iniciadas por César estava o banimento de todos os clubes e guildas não sancionados pelo governo, ainda que as organizações mais antigas tivessem permissão de realizar suas reuniões. Ele construiu uma nova biblioteca pública, repleta de obras gregas e latinas, sob a curadoria de Marco Terêncio Varrão (116-27 a.C.), encarregado de reunir e catalogar os livros. Planejou-se também a codificação do imenso corpo da lei romana: um projeto finalmente concluído séculos depois, sob o imperador bizantino Justiniano I (r. 527-565 d.C.). Entre seus planos contavam-se também um novo porto em Óstia e a drenagem dos Pântanos Pontinos e do Lago Fucino. Ele impôs pesadas taxas para itens de luxo e colocou guardas pela cidade para confiscar mercadorias importadas ilegalmente. Os guardas fiscalizavam até residências particulares.

Assassinato

Muitos em Roma aceitavam a arrogância de César, mas começaram a acreditar que ele se tornava mais uma figura divina do que o governante. “Mesmo as muitas reformas sociais positivas de César causavam ressentimento porque eram impostas através de ordens” (Rosenstein et al., 208). Nos Idos de Março, 15 de março de 44 a.C., um grupo de conspiradores liderados por Marco Júnio Bruto (85-42 a.C.) matou o ditador. O assassinato de Júlio César não trouxe de volta os dias gloriosos do passado; em vez disso, resultou em outra guerra civil.

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Perguntas e respostas

Quando Júlio César se tornou ditador?

Júlio César assumiu os poderes de um ditador pela primeira vez em 49 a.C.. Nomeações subsequentes seguiram-se até que com o tempo foi nomeado ditador perpétuo em 44 a.C., logo antes de sua morte.

Qual o impacto da ditadura de Júlio César em Roma?

Júlio César implantou várias reformas enquanto ditador: realizou um novo censo, aumentou o Senado Romano, concedeu cidadania romana aos líderes da Gália e Espanha, estabeleceu colônias de cidadãos e reformou o calendário.

Sobre o tradutor

Ricardo Albuquerque
Ricardo é um jornalista brasileiro que vive no Rio de Janeiro. Seus principais interesses são a República Romana e os povos da Mesoamérica, entre outros temas.

Sobre o autor

Donald L. Wasson
Donald ensina História Antiga, Medieval e dos Estados Unidos no Lincoln College (Normal, Illinois) e sempre foi e sempre será um estudante de história, dedicando-se, desde então, a se aprofundar no conhecimento sobre Alexandre, o Grande. É uma pessoa ávida a transmitir conhecimentos aos seus estudantes.

Citar este trabalho

Estilo APA

Wasson, D. L. (2023, Dezembro 11). César como Ditador e seu Impacto em Roma [Caesar As Dictator: His Impact on the City of Rome]. (R. Albuquerque, Tradutor). World History Encyclopedia. Obtido de https://www.worldhistory.org/trans/pt/2-112/cesar-como-ditador-e-seu-impacto-em-roma/

Estilo Chicago

Wasson, Donald L.. "César como Ditador e seu Impacto em Roma." Traduzido por Ricardo Albuquerque. World History Encyclopedia. Última modificação Dezembro 11, 2023. https://www.worldhistory.org/trans/pt/2-112/cesar-como-ditador-e-seu-impacto-em-roma/.

Estilo MLA

Wasson, Donald L.. "César como Ditador e seu Impacto em Roma." Traduzido por Ricardo Albuquerque. World History Encyclopedia. World History Encyclopedia, 11 Dez 2023. Web. 27 Abr 2024.