Caveiras, Templos & Igrejas: Uma Visita à Cidade Murada de Évora

Artigo

Kim Martins
por , traduzido por Joana Mota
publicado em 17 fevereiro 2020
Disponível noutras línguas: Inglês, espanhol
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A planície ensolarada da região do Alentejo, no centro de Portugal, é chamada de planície dourada pelos portugueses e é pontilhada por florestas de sobreiros, vinhas, olivais e cidades no topo de colinas com casas caiadas de branco. 'Alentejo' significa "além do rio Tejo" e há uma beleza crua nesta região agrícola que é particularmente evidente ao pôr do sol, quando a luz é ouro pálido.

Évora é a capital do Alentejo e o seu centro histórico foi classificado como Património Mundial da UNESCO em 1986. É uma cidade repleta de ruas estreitas em paralelos, igrejas históricas, azulejos pintados à mão e uma bela mistura de arquitetura moura e romana.

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Capela dos Ossos (The Chapel of Bones)
Capela dos Ossos
David Cross (CC BY-NC-SA)

A melhor forma de ver Évora é a pé e a uma curta distância uns dos outros existem três locais de visita obrigatória: a Capela dos Ossos, o Templo Romano de Diana e a Sé Catedral de Évora. Vamos fazer um passeio pela história e descobrir o encanto de Évora.

Uma Cidade Intemporal

A história de Évora remonta há mais de cinco milénios atrás. Antes de 57 a.C. era chamada de Ebora, nome que lhe foi dado pelos Célticos - as tribos celtas da Península Ibérica - que a usavam como capital regional. O nome pode ter derivado da palavra latina aurum (ouro), quer em referência à planície dourada do Alentejo, quer devido à exploração de ouro em Portugal. Também há uma sugestão de que 'Ebora' significa "dos teixos" na língua celta. Ebora foi mencionada na Geografia de Cláudio Ptolomeu (100-170 d.C.) e também por Plínio, o Velho (c. 23-79 d.C.) na sua História Natural, mas pouco se sabe sobre o período inicial de Ebora.

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O COMANDANTE ROMANO QUINTO SERTÓRIO (C. 123-72 D.C.) USAVA ÉVORA COMO SUA SEDE ENTRE 80-72 A.C.

Évora foi então colonizada pelos romanos em 57 a.C. e inicialmente chamada de Ebora Cerealis porque a fértil planície alentejana era uma fonte significativa de trigo, uma cultura importante para o Império Romano.

Os romanos construíram as muralhas defensivas conhecidas como Cerca Romana (Recinto Romano) e a secção romana dessas paredes permanece bem preservada. Évora era tão importante para o império que Júlio César (100-44 a.C.) a elevou à categoria de municipium (cidade autónoma) e acrescentou o título oficial Liberalitis Julia (Generosidade Juliana) durante o início do período Pax Romana (27 a.C. - 180 d.C.).

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Sob os romanos, Évora tornou-se um próspero centro comercial e um posto militar avançado quando o comandante do exército romano Quinto Sertório (c. 123-72 a.C.) usou a cidade como seu quartel-general entre 80-72 a.C.

Evora
Évora
Kim Martins (CC BY-NC-SA)

Com o declínio e queda do Império Romano, houve um período de presença visigótica no século VI, quando o Rei Leovigildo (c. 512-586 d.C.) governou Évora. Em 715 d.C., um exército mouro liderado por Abd al-Alaziz ibn Musa (falecido em 717 d.C.) ocupou a cidade e Coimbra. Évora esteve sob o domínio mouro até 1165 e foi chamada de Jabura. A influência da arquitetura moura pode ser vista hoje nas casas caiadas de branco da cidade com detalhes em cor mostarda, nos becos em arco e nos pátios de azulejos.

Os mouros foram então expulsos da região do Alentejo pelo cavaleiro cristão português, Geraldo Sem Pavor (falecido em 1173), conhecido como Geraldo, o Destemido, e Évora foi governada por Afonso Henriques I (1109/11 - 1185) que foi o primeiro rei de Portugal. A Praça do Giraldo - a praça central que serviu como mercado de Évora durante o período mouro - leva o nome de Geraldo, o Destemido.

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O que se segue são cerca de 400 anos durante os quais Évora foi a residência preferida dos reis das dinastias Afonsina (1139-1383) e de Avis (1383-1580). Évora tornou-se um centro cultural e um ponto de encontro de estudiosos, escritores e artistas. A Universidade de Évora foi fundada em 1559.

Peacocks in Jardim Publico de Evora
Pavões no Jardim Público de Évora
Kim Martins (CC BY-NC-SA)

A versão em português da Inquisição Espanhola chegou em 1536, quando foi criado um tribunal para julgar os hereges e ainda pode ver o edifício que era o Tribunal da Inquisição em frente ao museu da cidade. Exibe a cruz com a espada e o ramo de oliveira - os símbolos da Inquisição Espanhola.

Essas camadas históricas resultaram numa cidade que tem muitas histórias intrigantes para contar.

A Capela dos Ossos

A primeira história é a dos 5.000 ou mais ossos e crânios humanos no ossário da Capela dos Ossos anexo à Igreja de São Francisco, uma igreja no meio da cidade. Ninguém espera encontrar restos humanos empilhados do chão ao teto em paredes ou colunas de revestimento numa capela, mas é exatamente isso que o visitante verá neste local histórico um tanto macabro.

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Capela dos Ossos, Skeleton Wall
Capela dos Ossos, Parede de Esqueletos
Laredawg (CC BY-NC-SA)

A Capela dos Ossos foi construída por monges franciscanos no final do século XVI, quando a cidade enfrentou o dilema de cemitérios lotados. Ossos foram exumados e transferidos para a capela como uma solução criativa para o problema da sobrelotação, mas também para fornecer um memento mori ou lembrete da inevitabilidade da morte.

Ossários ou capelas de ossos são comuns ao longo da história e eram muitas vezes o resultado da necessidade de abrigar milhares de mortos numa vala comum devido a peste ou atrocidades de guerra. Há uma capela de osso em Faro, na região do Algarve de Portugal, completa com um esqueleto de ouro e as catacumbas de Paris são o local de descanso final para 6.000.000 dos seus antigos habitantes.

A capela dos ossos de Évora é pequena e seu desenho é baseado no ossário de São Bernadino all Ossa em Milão, Itália. Sente que está numa caverna e um tanto oprimido por milhares de ossos e crânios meticulosamente dispostos. Os restos mortais dos monges franciscanos estão guardados num pequeno túmulo branco à direita do altar-mor.

Capela dos Ossos Bone Pillar
Capela dos Ossos, Pilar de Osso
Stephen Colebourne (CC BY-NC-SA)

Évora era uma cidade materialista e rica e os franciscanos quiseram proporcionar um espaço de contemplação sobre a existência humana. Acima da porta da capela está uma inscrição que certamente perturbará qualquer visitante:

Nós ossos que aqui estamos, pelos vossos esperamos

Há também um poema numa moldura de madeira que está pendurado num dos pilares da capela e diz em parte:

Para onde vai com tanta pressa viajante?

Pare … não prossiga;

Você não tem maior preocupação,

Do que esta: aquela em que você foca a sua visão.

Um guia turístico também indicará dois cadáveres desidratados pendurados por correntes numa parede ao lado de uma cruz. Um é de um homem adulto, o outro é uma criança, possivelmente o seu filho, e a lenda diz que o filho maltratou a sua mãe e, por isso, ela amaldiçoou-os a ficarem pendurados ali por toda a eternidade.

Capela dos Ossos, Evora, Portugal
Capela dos Ossos, Évora, Portugal
Sergei Gussev (CC BY-NC-SA)

O que resta ver na capela antes de sair pela porta para ver mais locais históricos são os belos frescos no teto abobadado, que datam de 1810, e apresentam símbolos que ilustram passagens bíblicas.

O Templo de Diana

O Templo de Diana (Templo Romano Évora) é o local histórico mais antigo de Évora e conta a história do domínio romano na cidade. Fica a dez minutos a pé da Capela dos Ossos e situa-se no Largo Conde Vila Flor, numa colina e num dos pontos mais altos de Évora.

Os visitantes são livres para caminhar em redor do templo em estilo de Corinto a qualquer hora do dia ou da noite. Uma visita noturna é altamente recomendada, já que o templo é iluminado por holofotes e é impressionante, se não um pouco assustador.

Temple of Diana
Templo de Diana
Kim Martins (CC BY-NC-SA)

O templo voltado para o sul foi construído no século I e acredita-se que tenha sido dedicado à deusa caçadora romana Diana, embora não haja evidências arqueológicas que o justifiquem. Muito provavelmente, foi dedicado a Augusto César (r. 27 a.C. - 14 d.C.).

Apenas 14 das 32 colunas caneladas originais permanecem. As colunas têm uma disposição periférica (planta retangular emoldurada nos quatro lados por uma colunata) e assentam sobre uma base de granito com 3,5 m de altura. No lado norte do templo, ainda pode ver seis colunas de granito com 7,68 m de altura. As colunas, arquitrave e base são feitas a partir granito local e as colunas assentam num pé de mármore proveniente da vizinha Estremoz.

Temple of Diana
Templo de Diana
João Miguel (CC BY-NC-SA)

O templo sofreu grandes danos no século V, quando saqueadores germânicos invadiram a cidade. No século XI, o Castelo de Évora (agora desmantelado) foi construído em torno do templo e a sua base, colunas e arquitrave foram incorporadas na torre do castelo, que mais tarde foi convertida em matadouro. O trabalho de restauração do templo começou em 1836, e o templo que o visitante vê hoje é o resultado das teorias de conservação da época, particularmente as do crítico de arte inglês John Ruskin (1819-1900).

Sé Catedral de Évora

A nossa última paragem é a Sé Catedral situada na Acrópole de Évora, o ponto mais alto da cidade e a poucos passos do Templo de Diana - os dois edifícios estão praticamente lado a lado. É a maior catedral medieval de Portugal e foi desenhada em forma de cruz latina. Pensa-se que a catedral foi construída propositadamente no local de uma antiga mesquita como um ato simbólico pelos cruzados do século XII.

A CATEDRAL DE EVORA FOI CONSTRUÍDA NO ESTILO ROMANO-GÓTICO.

A catedral também é conhecida como Sé Catedral de Évora, mas o seu nome correto é Basílica Sé de Nossa Senhora da Assunção.

Foi construída durante os séculos XII-XIII e tem uma bela fachada de granito rosa, que dá à catedral seu tom rosa distinto. A construção foi iniciada em c. 1186, a catedral foi consagrada em 1204 e concluída em 1250.

Interior of Evora Cathedral
Interior da Sé Catedral de Évora
Ken & Nyetta (CC BY-NC-SA)

Embora a catedral tenha sido construída em estilo Romano-Gótico, a renovação e restauração ao longo dos anos produziram uma mistura de estilos arquitetónicos. Foi restaurada em estilo gótico (c. 1400), e ainda se pode ver duas grandes rosáceas que iluminam o interior da catedral. Diz-se que o explorador português, Vasco da Gama, mandou abençoar as bandeiras da sua frota de navios na catedral em 1497.

Uma característica interessante do edifício são as duas torres assimétricas construídas entre c. 1200 e o século XVI. A torre do relógio, no lado sul, tem uma escada em espiral e os seus sinos tocam a hora em toda a cidade; a torre norte tem um pináculo em forma de cone de cerâmica azul ao estilo Manuelino (final do Gótico português, início do século XVI).

Evora Cathedral
Sé Catedral de Évora
Felicity and Phillip (CC BY-NC-SA)

Existem três entradas para a catedral: a porta sul (Porta do Sol) apresenta arcos Góticos, a entrada norte foi reconstruída durante o período Barroco (c. 1600-1750), e a entrada principal entre as duas torres tem seis arquivoltas apoiadas por esculturas dos doze apóstolos, atribuídas a Pero e Telo de Garcia (escultores espanhóis do século XIV).

Há uma maior mistura de estilos artísticos no interior da igreja. O altar central é do século XVIII e é feito de mármore rosa, preto e branco; há uma escultura incomum do século XV de uma Virgem Maria grávida; o órgão tubular é do final do século XVI; e o coro é da época Manuelina.

Statues of the Apostles
Estátuas dos Apóstolos
Rei Artur (CC BY-NC-SA)

O visitante verá certamente que a Sé Catedral de Évora é um exemplo maravilhoso de um edifício que passou por diferentes períodos históricos e diferentes estilos arquitetónicos, mas ainda manteve uma aparência geral Gótica.

Antes de sair da catedral, suba ao terraço do último piso para uma vista panorâmica de 360 graus de Évora.

Como Chegar Lá

Pode visitar Évora numa viagem de um dia saindo da capital de Portugal, Lisboa, já que a viagem dura apenas cerca de 1,5 horas (130 km) ou pode apanhar o comboio da Estação Oriente de Lisboa para a estação de Évora ou apanhar o autocarro intercidades na Estação Rodoviária de Sete Rios em Lisboa.

Mas é muito melhor aproveitar o seu tempo para explorar os muitos locais históricos que Évora tem para oferecer e desfrutar de um passeio no Jardim Público de Évora, onde poderá ver pavões desfilarem com a sua plumagem. Uma vez que o jardim público não fica longe do mercado central, apareça e compre alguns pastéis de toucinho, que é uma tarte doce feita com bacon, ovo, amêndoas, açúcar e canela. Depois disso, deve ter toda a energia necessária para ver os crânios, templos e igrejas de Évora.

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Bibliografia

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Sobre o tradutor

Joana Mota
Sou portuguesa e, atualmente, vivo no meu país. Sou farmacêutica, biomédica e tradutora freelance. Adoro viajar, conhecer pessoas novas e melhorar o meu conhecimento sobre diferentes culturas.

Sobre o autor

Kim Martins
A Kim é uma escritora freelancer sediada na Nova Zelândia. Ela tem uma Licenciatura em História e Mestrado em Ciência do Caos & Complexidade. Os seus interesses especiais são fábulas e mitologia, bem como a exploração do mundo antigo.

Citar este trabalho

Estilo APA

Martins, K. (2020, fevereiro 17). Caveiras, Templos & Igrejas: Uma Visita à Cidade Murada de Évora [Skulls, Temples & Churches: A Visit to the Walled City of Evora]. (J. Mota, Tradutor). World History Encyclopedia. Obtido de https://www.worldhistory.org/trans/pt/2-1497/caveiras-templos--igrejas-uma-visita-a-cidade-mura/

Estilo Chicago

Martins, Kim. "Caveiras, Templos & Igrejas: Uma Visita à Cidade Murada de Évora." Traduzido por Joana Mota. World History Encyclopedia. Última modificação fevereiro 17, 2020. https://www.worldhistory.org/trans/pt/2-1497/caveiras-templos--igrejas-uma-visita-a-cidade-mura/.

Estilo MLA

Martins, Kim. "Caveiras, Templos & Igrejas: Uma Visita à Cidade Murada de Évora." Traduzido por Joana Mota. World History Encyclopedia. World History Encyclopedia, 17 fev 2020. Web. 31 out 2024.