Barba Negra

Definição

Mark Cartwright
por , traduzido por Ricardo Albuquerque
publicado em
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Ray Stevenson as Blackbeard (by Starz, Copyright, fair use)
Ray Stevenson como Barba Negra
Starz (Copyright, fair use)

Barba Negra (morte 1718), também conhecido como Edward Teach (provavelmente um nome falso), foi um famoso pirata inglês que operou no Caribe e no Atlântico durante uma surpreendentemente curta carreira, que durou apenas 15 meses. Com a longa barba negra amarrada com fitas, pavios sob o chapéu e várias pistolas a tiracolo, sua aparência, reputação e nome eram calculados para deixar as vítimas aterrorizadas e sem reação.

Em grande parte graças ao retrato bastante exagerado e fictício elaborado pelo autor Charles Johnson/Daniel Defoe (1660-1731), Barba Negra (ou Barba-Negra/Barbanegra) tornou-se o mais destacado de todos os piratas da assim chamada Era de Ouro da Pirataria. Costuma ser retratado como um homem sem moral ou escrúpulos, seja em relação às vítimas inocentes ou à própria tripulação e, como um pirata que teve apenas o que merecia, acabou morto em conflito com a Marinha Real inglesa, mas somente após ser atingido por cinco tiros de pistola e 20 golpes de espada.

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O Queen Anne's Revenge

Nada se conhece sobre a vida pregressa de Teach ao certo, com exceção do fato de que nasceu em Bristol, na Inglaterra, e passou os primeiros anos de sua carreira atacando navios franceses e espanhóis nas águas da Jamaica durante a Guerra da Sucessão Espanhola (1701-1714). Edward Teach, provavelmente era um nome falso, talvez adotado para esconder um passado sombrio. Ficou conhecido também como Edward Thatch (Thache) ou Thatch Drummond, possivelmente outros pseudônimos.

Teach bloqueou com sucesso a cidade portuária de Charleston, atacando pelo menos oito navios.

A partir de setembro de 1717, Teach serviu como capitão nas Bahamas, sob o comando do pirata inglês Benjamin Hornigold. Sua base, assim como outros tantos piratas, situava-se na ilha de New Providence. Os dois homens, cada qual comandando uma embarcação, atacaram navios no Caribe e na costa da América do Norte. Entre as capturas destaca-se a do Concorde, um navio francês a caminho da ilha da Martinica, carregado com ouro, moedas, pedras preciosas e outros artigos valiosos de feitorias africanas. Teach tomou esta embarcação em novembro de 1717, próximo a St. Vincent. Ele a renomeou como Queen Anne's Revenge [Vingança da Rainha Ana]. Com três mastros, costumava ser utilizado como navio negreiro. Estava equipado com 40 canhões, o que equivalia ao poder de fogo de muitos navios de guerra, e passou a ser empregado em ataques nas águas de St. Vincent e St. Kitts, no Mar do Caribe.

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The Queen Anne's Revenge
O Navio Queen Anne's Revenge
Qualiesin (CC BY-SA)

No início de 1718, Teach dispunha de uma tripulação total de 300-400 homens. Com certeza uma figura imponente, graças à estatura e à barba negra, amarrada com fitas pretas, era bastante respeitado pelos tripulantes. Testemunhas confirmam a rígida disciplina mantida entre os marinheiros de Teach. Conforme a lenda, tinha uma versão particularmente gráfica da bandeira pirata Jolly Roger, hasteada para garantir a rendição imediata das vítimas. Nela havia um esqueleto segurando uma ampulheta numa das mãos e, na outra, uma lança apontada para um coração sangrando. Estes símbolos serviam para alertar a quem estava na embarcação a ser abordada que seu tempo estava se esgotando e a morte seria o único resultado caso houvesse resistência.

O Queen Anne's Revenge e outro navio foram encalhados por Teach num banco de areia, talvez de forma deliberada.

Após mais algumas capturas, Teach navegou para a Carolina do Norte, onde prometeu desistir da pirataria e recebeu o perdão do governador Charles Eden. Muitos funcionários na costa leste das colônias americanas fechavam os olhos para a pirataria, seja devido ao seu envolvimento direto na atividade ou porque adquirir os produtos do saque costumava ser bem mais barato do que recorrer aos comerciantes legítimos. Na prática, a atração de presas fáceis como os navios mercantes mal-armados levou Teach novamente para a pirataria e, em março de 1718, ele conduziu o Queen Anne's Revenge para a Baía de Honduras. Ali conseguiu capturar o Revenge, embarcação do seu companheiro de pirataria Stede Bonnet (enforcado tempos depois, naquele mesmo ano). Após mais duas capturas, Teach passou a comandar uma frota de quatro navios e os ataques à marinha mercante ao longo da costa norte-americana continuaram em abril. Seu segundo em comando, Israel Hands, era o capitão da chalupa Adventure [Aventura]. Com quatro navios, Teach podia ambicionar prêmios maiores.

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A Costa da Carolina

Em maio de 1718, Teach bloqueou com sucesso Charleston (conhecida na época também como Charles Town), na Carolina do Sul, por duas semanas, atacando pelo menos oito navios. Os prisioneiros foram libertos ilesos mediante o pagamento de um resgate que incluía medicamentos, talvez necessários para tratar a sífilis entre a tripulação. Ao navegar pelas águas rasas de Beaufort Inlet, a caminho da Carolina do Norte, o Queen Anne's Revenge e um outro navio encalharam num banco de areia, talvez deliberadamente, para reduzir a excessiva tripulação de Teach, que exigia o pagamento de sua parte no butim. O Revenge foi devolvido a Bonnet, mas Teach, não pela primeira vez, pegou todo o saque transportado pela frota e partiu na chalupa restante. O Queen Anne's Revenge acabou afundando e é provável que seus destroços tenham sido descobertos e explorados em 1996. Os destroços continham vários artefatos relacionados às embarcações do período e a Teach, especialmente uma grande e incomum quantidade de canhões.

Blackbeard or Edward Teach
Barba Negra ou Edward Teach
Unknown Artist (Public Domain)

Ao chegar a Bath Towne, na Carolina do Norte, Teach recebeu outro perdão do governador Eden. Vendeu toda a carga e, inclusive, teve permissão de manter sua chalupa. Aparentemente regenerado, o pirata casou-se a seguir com a filha de 16 anos de um grande fazendeiro e instalou-se em Ocracoke Island. No entanto, passado o perseguia e um mandado de prisão foi expedido enquanto visitava a Filadélfia. Escapando para o mar novamente, Teach capturou dois navios franceses ao largo do arquipélago das Bermudas. Retornou então a Bath Towne com uma excelente carga de açúcar e cacau. Após subornar o governador e funcionários com barris de açúcar, Teach recebeu uma sentença favorável de um tribunal local, segundo o qual ele só havia resgatado a carga de um navio abandonado, livrando-se, dessa forma, de qualquer acusação de pirataria. É provável que tenha prosseguido com suas atividades de pirataria com a autorização do governador, graças aos subornos regulares e substanciais.

A Morte de Teach

Ao contrário de seu colega da vizinha Carolina do Norte, o governador da Virgínia, Alexander Spotswood, estava determinado a suprimir a pirataria, assim como vários comerciantes ricos e poderosos. Quando o ex-contramestre de Teach testemunhou os feitos ilegais do seu capitão, a Marinha Real britânica enviou duas chalupas para levar o pirata à justiça. Eles partiram em novembro de 1718, com o incentivo adicional de uma recompensa de 100 libras pela captura de Edward Teach, vivo ou morto.

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A essa altura, Teach dispunha de apenas 20-25 homens em sua base, mas ainda assim embarcou em sua chalupa e se preparou para repelir o ataque da marinha, após avistar os navios cruzando as águas rasas da enseada de Ocracoke. No dia 22 de novembro, os navios britânicos encalharam num banco de areia e o capitão pirata, cumprindo sua declaração de não dar trégua e não receber nenhuma em troca, aproveitou a oportunidade para disparar seus canhões contra os alvos fáceis. Um dos navios ficou inutilizável, mas a outra embarcação, comandada pelo tenente Robert Maynard, voltou a flutuar e navegou em direção à chalupa pirata. Maynard e a maioria de seus homens esconderam-se nos conveses inferiores até o último momento. Os homens de Teach abordaram o navio e os dois grupos se enfrentaram no convés, num alvoroço de disparos de pistolas e golpes de espadas. Teach e Maynard ficaram frente a frente numa luta encarniçada. O pirata, mesmo baleado e ferido por um golpe de espada no pescoço, continuou lutando. Teach só caiu após cinco tiros de pistola e mais de 20 golpes de espada e um highlander [soldado escocês], desferiu o golpe final de decapitação. Logo surgiu uma lenda local segundo a qual o cadáver flutuante e sem cabeça deu três voltas em torno do navio que havia causado sua queda. O tenente Maynard postou a cabeça de Teach na proa da embarcação como um aviso aos demais piratas, conforme anotado em seu diário de bordo de 3 de janeiro de 1719:

Pouco vento e bom tempo neste dia ancorei aqui [Williamsburg] vindo da Carolina do Norte na chalupa Adventure de Edward Thache, anteriormente Mestre (um Pirata) cuja cabeça pendurei sob o gurupés da referida chalupa, a fim de apresentá-lo à Colônia da Virgínia e os Bens e Objetos Pessoais do dito Pirata coloquei à disposição dos meus comandantes. (Cordingly, 200)

Os marinheiros da tripulação de Teach foram julgados e enforcados, com exceção de Israel Hands, que recebeu o perdão real graças ao seu valioso testemunho contra os funcionários corruptos da Carolina do Norte.

Blackbeard
Barba Negra
Benjamin Cole (Public Domain)

Para um pirata tão famoso, Teach desfrutou de bem poucas vitórias. Sua carreira durou somente 15 meses e os alvos dificilmente podiam ser considerados navios de tesouros. As 23 embarcações capturadas por Teach tornavam-se insignificantes em comparação com as mais de 400 capturas do pirata galês Black Bart Roberts (ou Bartholomew Roberts, cerca de 1682-1722) durante sua infame carreira. Os armazéns de mercadorias como açúcar, algodão e cacau, descobertos na base de Teach, em Ocracoke Island, após sua morte, foram avaliadas em pouco mais de duas mil libras. Não há evidência de que o pirata tenha enterrado um tesouro fantástico após suas incursões. Nem existe qualquer evidência de que tenha torturado ou maltratado seus cativos e se comportado de maneira cruel com sua tripulação. Na morte, porém, Teach alcançaria muito mais do que jamais conseguira em vida. Ele rapidamente se tornou uma lenda, o paradigma do pirata louco e cruel que aterrorizava os mares.

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O Barba Negra de Daniel Defoe

Poucos anos depois de morrer, uma biografia de Edward Teach, além de vários outros piratas, apareceu na célebre obra de Daniel Defoe, História Geral dos Roubos e Assassinatos dos mais Notórios Piratas, compilada na década de 1720. O livro foi creditado a um certo capitão Charles Johnson na página de título, mas se trata talvez de um pseudônimo de Defoe (embora alguns estudiosos ainda estejam debatendo o tema e Johnson pode ter sido um especialista em pirataria real, ainda que inteiramente desconhecido). O livro, que mistura fato e invenção sem nenhum esclarecimento aos leitores sobre o que é realidade ou pura invenção, transformou-se num sucesso imediato e definiu como os piratas têm sido representados desde então. Como o Barba Negra da obra de Defoe, Teach aparece, em detalhes escabrosos, como um monstro capaz de qualquer atrocidade, desde estupros até execuções abomináveis. O autor claramente teve acesso a documentos oficiais, registros de julgamentos e relatos jornalísticos contemporâneos e muitas declarações mostraram-se factuais quando corroboradas por registros históricos. No entanto, também há exageros sem conta e puras invenções, como conversas privadas e discursos aparentemente repetidos na íntegra. É significativo, talvez, que Defoe tenha sido um jornalista e autor bem-sucedido, ou seja, sabia exatamente como mesclar fato e ficção para obter o maior efeito literário.

Map of the Spanish Main & Caribbean Pirate Havens  c. 1670
As Possessões Espanholas e os Refúgios Piratas do Caribe por volta de 1670
Simeon Netchev (CC BY-NC-ND)

O retrato magistral de Teach/Barba Negra feito por Defoe inclui esta descrição física memorável:

O capitão Teach assumiu o cognome de Barba-Negra, devido à abundância de pelos que, como um meteoro assustador, cobriam todo o seu rosto, e amedrontou a América mais do que qualquer cometa que tenha aparecido ali em tempos passados.

Sua Barba era negra e ele se esforçava para deixá-la crescer num comprimento extravagante; quanto à largura, chegava aos olhos; ele costumava amarrá-la com fitas em pequenas mechas [...] e as colocava em torno das orelhas. Quando entrava em ação, vestia um talabarte no qual carregava três braçadeiras de pistolas dentro dos seus coldres à bandoleira; espetava pavios acesos sob o chapéu nos dois lados do rosto e, com seus olhos, que pareciam naturalmente ferozes e selvagens, tornava-se uma figura tal que a imaginação não pode conceber uma fúria do Inferno que pareça mais assustadora. (Defoe/Johnson, 84-5)

As Diversões do Barba Negra

Contrariando todas as evidências, Defoe descreve Barba Negra como um verdadeiro monstro, com uma veia sádica tão ampla quanto a esteira do seu navio. Não apenas se comportava como o flagelo dos inocentes, mas nem a tripulação escapava de seus entretenimentos diabólicos. Num destes episódios narrados no livro, o instável capitão trancou-se com vários tripulantes no compartimento de carga e queimou enxofre até que todos quase sufocassem, abrindo as escotilhas no último minuto.

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Blackbeard's Fight to the Death
A Luta até a Morte de Barba Negra
Jean Leon Gerome Ferris (Public Domain)

Em outra ocasião, Barba Negra teria abandonado 15 tripulantes numa pequena rocha estéril nas proximidades de Tortola, nas Ilhas Virgens Britânicas, conhecida pelos marinheiros como The Dead Man's Chest [Baú do Homem Morto], atualmente chamada Dead Chest Island. Ele deixou os homens com um baú de tesouro, um cutelo e uma garrafa de rum para cada um. Barba Negra, sem dúvida, esperava que os homens se matassem para garantir uma parcela maior do butim, mas ficou desapontado ao retornar ao local um mês depois e encontrar os 15 marinheiros vivos.

Em outro "jogo", ele pegou duas pistolas, soprou a vela que iluminava o aposento e atirou em Israel Hands sob a mesa da cabine, depois que este adormeceu jogando cartas. O capitão acertou o imediato no joelho com uma bala, mas errou a outra. Quando indagado pela tripulação por que havia feito tal coisa, o pirata replicou que "se não matasse um deles de vez em quando, acabariam esquecendo de quem ele era". (Defoe/Johnson, 84).

Barba Negra também aparece com um prodigioso apetite sexual, com vários encontros lascivos e nada menos do que 14 esposas, que tinha o hábito de prostituir com seus homens. Em contraste, um governador observou, em janeiro de 1718, a respeito de Teach, que "diz-se que tem uma esposa e filhos em Londres" (citado em Cordingly, 71). A despeito das divergências entre fato e ficção, a imagem de Barba Negra apresentada por Defoe como um capitão pirata debochado foi repetida em obras de ficção posteriores, mais notavelmente por Robert Louis Stevenson em seu livro Master of Ballantrae [O Senhor de Ballantrae], publicado em 1889. O notório pirata também se tornou o protagonista de um musical londrino no final do século XIX, de autoria de James Cross e intitulado Blackbeard, or the Captive Princess [Barba Negra ou a Princesa Cativa]. No século XX, ainda que retratado como um vilão completo no popular filme de 1952, Blackbeard the Pirate [Barba Negra, o Pirata], sua figura tornou-se tão ultrajada que restringiu-se a um personagem anedótico em comédias como o filme da Disney Blackbeard's Ghost [O Fantasma de Barba Negra], de 1968.

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Sobre o tradutor

Ricardo Albuquerque
Jornalista brasileiro que vive no Rio de Janeiro. Seus principais interesses são a República Romana e os povos da Mesoamérica, entre outros temas.

Sobre o autor

Mark Cartwright
Mark é escritor, pesquisador, historiador e editor. Tem grande interesse por arte, arquitetura e pela busca das ideias que todas as civilizações compartilham. Possui mestrado em Filosofia Política e é Diretor Editorial da WHE.

Citar este trabalho

Estilo APA

Cartwright, M. (2021, agosto 19). Barba Negra [Blackbeard]. (R. Albuquerque, Tradutor). World History Encyclopedia. Recuperado de https://www.worldhistory.org/trans/pt/1-19978/barba-negra/

Estilo Chicago

Cartwright, Mark. "Barba Negra." Traduzido por Ricardo Albuquerque. World History Encyclopedia. Última modificação agosto 19, 2021. https://www.worldhistory.org/trans/pt/1-19978/barba-negra/.

Estilo MLA

Cartwright, Mark. "Barba Negra." Traduzido por Ricardo Albuquerque. World History Encyclopedia. World History Encyclopedia, 19 ago 2021, https://www.worldhistory.org/Blackbeard/. Web. 04 jul 2025.