Religião romana

Definição

Donald L. Wasson
por , traduzido por Lucas de Oliveira
publicado em 13 novembro 2013
Disponível : Inglês, francês, espanhol, Turco
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Roman Sacrificial Altar (by Mark Cartwright, CC BY-NC-SA)
Altar de sacrifício romano
Mark Cartwright (CC BY-NC-SA)

Em muitas sociedades, antigas e modernas, a religião desempenhou um papel importante no seu desenvolvimento, e o Império Romano não foi diferente. Desde o início, a religião romana era politeísta, com uma variedade de deuses e espíritos, Roma aumentou esta coleção para incluir tanto deuses gregos e uma série de cultos estrangeiros. À medida que o império se expandia, os romanos evitaram impor as suas próprias crenças religiosas àqueles que conquistavam. No entanto, esta inclusão não deve ser mal interpretada como tolerância, conforme se pode observar na sua reação inicial à população judaica e cristã. Eventualmente, todos os seus deuses acabariam por ser eliminados, gradualmente substituídos pelo cristianismo e, aos olhos de alguns, esta mudança provocou o declínio do império ocidental.

Crenças e influências primitivas

As primeiras formas de religião romana eram de natureza animista, acreditando que os espíritos habitavam tudo à sua volta, incluindo as pessoas. Os primeiros cidadãos de Roma também acreditavam que eram vigiados pelos espíritos dos seus antepassados. Inicialmente, uma Tríade Capitolina (possivelmente derivada de uma influência sabina) foi adicionada a estes “espíritos”, os novos deuses incluíam Marte, o deus da guerra e suposto pai de Rómulo e Remo (fundadores de Roma); Quirino, o Rómulo deificado que vigiava o povo de Roma; e por último, Júpiter, o deus supremo. Esses deuses, juntamente com os espíritos, eram venerados num templo situado no monte Capitolino. Mais tarde, devido aos etruscos, a tríade mudaria para incluir Júpiter, que continuou a ser o deus supremo; Juno, a sua esposa e irmã; e Minerva, a filha de Júpiter.

Devido à presença de colónias gregas na Península Inferior, os romanos adotaram muitos dos deuses gregos como seus próprios deuses. A religião e o mito tornaram-se um só. Sob esta influência grega, os deuses romanos tornaram-se mais antropomórficos - com as caraterísticas humanas de ciúme, amor, ódio, etc. No entanto, esta transformação não atingiu o grau que existia na mitologia grega. Em Roma, a expressão individual da crença não tinha importância, sendo muito mais importante a adesão estrita a um conjunto rígido de rituais, evitando assim os perigos do zelo religioso. As cidades adotavam as suas próprias divindades patronais e realizavam os seus próprios rituais. Os templos em honra dos deuses eram construídos por todo o império; no entanto, estes templos eram considerados a “casa” do deus; a adoração ocorria fora do templo. Embora esta fusão de divindades romanas e gregas tenha influenciado Roma de muitas formas, a sua religião continuou a ser praticada.

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A RELIGIÃO ROMANA ABSORVEU MUITOS DOS DEUSES E CULTOS DAS NAÇÕES CONQUISTADAS.

Apesar de existirem quatro colégios para sacerdotes, não havia uma classe sacerdotal, que continuaria a ser sempre um cargo público. Esta prática iria estender até ao palácio imperial. A partir do tempo do imperador Augusto, o imperador assumiria o título de pontifex maximus ou chefe dos sacerdotes. Para além dos pontifexes, existiam os augures, indivíduos que liam as entranhas dos animais e o voo das aves para interpretar os presságios ou, por outras palavras, a vontade dos deuses. Realizavam rituais elaborados para obter a vitória romana nas batalhas, e nenhuma declaração de guerra ou acontecimento importante era realizado sem a aprovação clara dos deuses. Desde o tempo dos etruscos, era sempre consultado um adivinho ou haruspices, e era considerado perigoso ignorar os presságios. Spurinna, um adivinho romano, lia as entranhas dos animais e previu a morte de Júlio César nos Idos de março. Quando o comandante romano Publius Claudius Pulcher ignorou os presságios - recusa das galinhas sagradas para comer - antes de uma batalha durante a Primeira Guerra Púnica, foi derrotado, tal como a sua carreira militar.

Com a expansão do império através dos Balcãs, da Ásia Menor e do Egito, a religião romana absorveu muitos dos deuses e cultos das nações conquistadas, mas a principal influência continuou a ser a Grécia. Com apenas algumas exceções, a maioria dos deuses romanos tinha os seus equivalentes gregos. Esta mitologia romana viria a ter uma influência significativa no império - política e socialmente - bem como no futuro da civilização ocidental. Basta olhar para os nomes dos dias e dos meses (terça-feira, sábado, janeiro e junho), para as línguas das nações europeias e para os nomes dos planetas (Marte, Júpiter, Saturno e Plutão) para perceber esta influência.

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O Panteão Romano

Enquanto o estudo da mitologia romana tende a enfatizar os deuses maiores - Júpiter, Neptuno (deus do mar), Plutão (deus do submundo) e Juno - existia, naturalmente, uma série de deuses e deusas “menores”, como Némesis, o deus da vingança; Cupido, o deus do amor; Pax, o deus da paz; e as Fúrias, deusas da vingança.

No entanto, quando se analisa a religião de Roma, é preciso examinar o impacto dos deuses mais importantes. Entre os deuses mais importantes estavam, evidentemente, Júpiter, o equivalente romano de Zeus (embora não tão brincalhão), e a sua esposa/irmã Juno. Ele era o rei dos deuses; o deus do céu (o grande protetor) - controlando o tempo e as forças da natureza, usando os raios para avisar o povo de Roma. Originalmente ligado à agricultura como Júpiter Elicius, o seu papel mudou à medida que a cidade crescia, acabando por obter o seu próprio templo no Monte Capitolino. Mais tarde, tornou-se Júpiter Imperator Invictus Triumphator - General Supremo, Invencível e, finalmente, Júpiter Optimus Maximus - Melhor e Maior. A sua supremacia seria temporariamente posta de lado durante o reinado do imperador Elagabalus, que tentou substituir a religião de Roma pela do deus sírio Elagabal. Após o assassinato do imperador, o seu sucessor, Alexandre Severo, devolveu a Júpiter a sua antiga glória. A seguir, a mulher/irmã de Júpiter era Juno, que dá nome ao mês de junho - era o equivalente à Hera grega. Para além de ser a deusa suprema com um templo no monte Esquilino, era a deusa da luz e da lua, encarnando todas as virtudes da matrona romana - como Juno Lucina tornou-se a deusa do parto e da fertilidade.

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Jupiter
Júpiter
Mark Cartwright (CC BY-NC-SA)

Depois de Juno vem Minerva, o nome romano de Atena (a deusa padroeira de Atenas), e Marte, o deus da guerra. Segundo a lenda, Minerva nasceu da cabeça de Júpiter completamente formada. Era a deusa do comércio, da indústria e da educação. Mais tarde, seria identificada como uma deusa da guerra, bem como a deusa dos médicos, músicos e artesãos. Embora já não fizesse parte da tríade Capitolina, Marte continuou a ser um deus importante para Roma - semelhante a Ares, o deus grego da guerra. Marte, o Vingador, esse filho de Juno e da sua relação com uma flor, teve um templo dedicado a ele pelo imperador Augusto, honrando a morte dos assassinos de Júlio César. Os comandantes romanos faziam sacrifícios a ele antes e depois das batalhas e terça-feira (Martes) recebeu o seu nome.

Há uma série de deuses menores (todos com templos construídos para eles) - Apolo, Diana, Saturno, Vénus, Vulcano e Jano. Em Roma, Apolo não tem um igual e é simplesmente o deus grego da poesia, da medicina, da música e da ciência. Foi originalmente trazido para a cidade pelos etruscos para afastar a peste e foi recompensado com um templo no Monte Palatino. Diana, a irmã romana de Apolo, equivalente à grega Ártemis, era não só a deusa dos animais selvagens e da lua das colheitas, mas também a deusa da caça. Era vista como protetora das mulheres durante o parto, tendo um templo em Éfeso, na Ásia Menor. Outro deus trazido para Roma pelos etruscos foi Saturno, um deus da agricultura igual ao grego Cronus e que tinha sido expulso do céu por Júpiter. Um festival em sua honra, a Saturnália, era realizado anualmente entre os dias 17 e 23 de dezembro. O seu templo, situado no monte Capitolino, guardava o tesouro público e os decretos do Senado. Outra deusa romana era Vénus, que nasceu, segundo o mito, da espuma do mar, igual à Afrodite grega. De acordo com Homero, ela era a mãe de Aenaes, o herói da Guerra de Troia. Claro que o planeta Vénus tem o seu nome. A seguir, Vulcano, também expulso do céu por Júpiter, era coxo (devido à sua expulsão), um ferreiro feio e o deus do fogo. Por fim, havia Jano, que não tinha igual na Grécia. Era o guardião de duas faces das portas e dos portões públicos. Jano era valorizado pela sua sabedoria e era o primeiro deus mencionado na oração de uma pessoa; por causa das suas duas faces, podia ver tanto o passado como o futuro.

Não podemos nos esquecer das Virgens Vestais, que não tinham nenhuma contraparte grega. Elas eram as guardiãs da lareira pública no Atrium Vesta. Eram moças escolhidas apenas entre a classe patrícia, com a baixa idade de seis anos, que começavam a servir à deusa Vesta aos dez anos e, pelos próximos trinta anos, a serviriam. Enquanto servia como Virgem Vestal, a menina/mulher era proibida de se casar e tinha de permanecer virgem. Algumas optavam por permanecer a serviço de Vesta depois de cumprir seus trinta anos, já que, aos quarenta anos, eram consideradas velhas demais para se casar. A quebra do voto de castidade resultaria em morte - apenas vinte quebraram o voto em mais de mil anos. O imperador Elagabalus tentou se casar com uma virgem vestal, mas foi convencido do contrário.

Gold Bacchus Statue
Estátua de Ouro de Baco
Mark Cartwright (CC BY-NC-SA)

Culto de adoração

Além da adoração desses deuses, havia vários cultos - Baco, Cibele, Ísis, Sarapis, Sibila e, acima de tudo, o Culto Imperial. Alguns eram prontamente aceitos pela sociedade romana, enquanto outros eram temidos pelos detentores do poder. Baco era uma divindade romana associada tanto ao deus grego Dionísio quanto ao antigo deus romano Liber Patri, também um deus do vinho. Baco é mais lembrado por seus festivais de embriaguez realizados em 17 de março, um dia em que um jovem romano se tornaria um homem. À medida que seu culto se espalhou, o Senado romano percebeu seu potencial perigoso e ordenou sua suspensão em 186 a.C. e, depois disso, o culto se tornou clandestino.

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Outro culto era centrado em Cibele, a “grande mãe” - uma deusa da fertilidade com um templo no Monte Palatino que era responsável por todos os aspectos do bem-estar de uma pessoa. A deusa chegou a Atenas no século V a.C. e apareceu pela primeira vez em Roma durante as Guerras Púnicas. Todos os seus sacerdotes eram eunucos, e muitos de seus seguidores homens se castravam. A próxima é Ísis, a antiga deusa do Egito que é mais lembrada na mitologia egípcia como esposa de Osíris e mãe de Hórus. Depois de se tornar helenizada, ela se tornou a protetora dos marinheiros e pescadores. Chegando a Roma vindo de Alexandria, Sarpis era um deus da cura e os doentes iam até seu templo para serem curados. Sibila era uma sacerdotisa do deus grego e do deus romano Apolo que veio para Roma da colônia grega de Cumae. Ela ofereceu ao rei etrusco Tarquínio os nove Livros Sibilinos, que eram livros de profecia, mas o preço foi considerado muito alto, então ele recusou. Depois que ela queimou seis dos livros, ele reconsiderou e comprou os três restantes; esses três livros eram consultados pelo Senado romano em momentos de emergência, mas foram perdidos durante as invasões bárbaras do século V d.C.

Por fim, havia o Culto Imperial. A ideia de deificação do imperador surgiu na época do imperador Augusto. Ele resistiu às tentativas do Senado de nomeá-lo um deus durante seu reinado, pois se considerava filho de um deus, não um deus. Após sua morte, o Senado Romano o recompensou com a deificação, uma honra que seria concedida a muitos de seus sucessores. Geralmente, um imperador solicitava que seu antecessor fosse deificado. É claro que havia algumas exceções, especialmente Tibério, Calígula, Nero e Domiciano, que eram considerados abomináveis demais para receber essa honra. Calígula e Nero acreditavam que eram deuses vivos, enquanto Domiciano se considerava a reencarnação de Hércules.

Commodus As Hercules
Commodus como Hércules
Mark Cartwright (CC BY-NC-SA)

Desafios da religião romana

O judaísmo e o cristianismo, embora representassem ameaças distintas ao império, tinham uma coisa em comum: ambos se recusavam a participar da adoração dos deuses romanos e a fazer sacrifícios em seus templos. Embora os judeus tivessem se estabelecido firmemente no império, eles eram frequentemente o alvo dos imperadores, muitas vezes culpados por todos os males que se abatiam sobre o império. Nero mandou expulsá-los de Roma, e Tito, filho do imperador Vespasiano, continuaria a guerra de seu pai contra os judeus nas Guerras Judaicas, acabando por destruir a cidade de Jerusalém e matar milhares de seus cidadãos.

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Embora o cristianismo tenha sido visto inicialmente como uma seita do judaísmo, o imperador Nero ficou mais desconfiado à medida que essa pequena seita começou a crescer, especialmente após o Grande Incêndio de Roma; ele até os culpou pelo incêndio. Eles retribuíram o favor, chamando-o de anticristo. Com o passar do tempo, o cristianismo continuou a se espalhar pelo império, atraindo mulheres e escravos, bem como intelectuais e analfabetos. As perseguições aumentaram, com igrejas cristãs sendo queimadas, e tudo isso continuou sob o reinado de Diocleciano (imperador do Oriente), terminando na Grande Perseguição. Para muitos, os cristãos ofendiam a pax deorum ou “paz dos deuses”.

Por fim, com o sucessor de Diocleciano, o imperador Constantino, o cristianismo finalmente seria reconhecido no Édito de Milão, em 313 d.C. A benevolência de Constantino para com o cristianismo pode ser atribuída à Batalha de Milvan Bridge, em 312 d.C., quando ele teve uma visão (uma cruz no céu), o que lhe permitiu sair vitorioso e se tornar o imperador de um Império Romano unido. Mais tarde, em 325 d.C., ele realizou o Concílio de Nicéia, reconciliando as diferenças entre as várias seitas cristãs. Ele reconstruiu as igrejas destruídas por Diocleciano e, de acordo com algumas fontes, converteu-se ao cristianismo em seu leito de morte (sua mãe era cristã). Após sua morte, o cristianismo continuaria a crescer e, por fim, ofuscaria e substituiria a religião romana tradicional, e Roma até se tornaria o novo centro do cristianismo. No entanto, no final, o cristianismo ainda receberia a culpa pelos males do império. Em seu livro The History of the Decline and Fall of the Roman Empire (A História do Declínio e Queda do Império Romano), Edward Gibbon atribuiu, em parte, a culpa pela queda do império ao cristianismo. Em sua visão, ela absorvia a energia do povo, tornando incapaz de enfrentar as adversidades que assolavam o império. No entanto, apesar de seus altos e baixos, desde os dias dos espíritos que habitavam todas as coisas, passando pelos deuses romanos/gregos e pela deificação do imperador até o cristianismo, a religião sempre permaneceu uma parte importante da sociedade romana.

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Bibliografia

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Sobre o tradutor

Lucas de Oliveira
Sou Lucas, nascido no Brasil, moro no Rio de Janeiro, atualmente estou cursando bacharelado em tradução e sou apaixonado por inglês.

Sobre o autor

Donald L. Wasson
Donald ensina História Antiga, Medieval e dos Estados Unidos no Lincoln College (Normal, Illinois) e sempre foi e sempre será um estudante de História, dedicando-se, desde então, a se aprofundar no conhecimento sobre Alexandre, o Grande. É uma pessoa ávida a transmitir conhecimentos aos seus estudantes.

Citar este trabalho

Estilo APA

Wasson, D. L. (2013, novembro 13). Religião romana [Roman Religion]. (L. d. Oliveira, Tradutor). World History Encyclopedia. Recuperado de https://www.worldhistory.org/trans/pt/1-10552/religiao-romana/

Estilo Chicago

Wasson, Donald L.. "Religião romana." Traduzido por Lucas de Oliveira. World History Encyclopedia. Última modificação novembro 13, 2013. https://www.worldhistory.org/trans/pt/1-10552/religiao-romana/.

Estilo MLA

Wasson, Donald L.. "Religião romana." Traduzido por Lucas de Oliveira. World History Encyclopedia. World History Encyclopedia, 13 nov 2013, https://www.worldhistory.org/Roman_Religion/. Web. 12 jun 2025.