Marcello Malpighi

Definição

Mark Cartwright
por , traduzido por Ricardo Albuquerque
publicado em
Disponível : Inglês, francês
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Marcello Malpighi by Cignani (by Carlo Cignani, Public Domain)
Marcello Malpighi por Cignani
Carlo Cignani (Public Domain)

Marcello Malpighi (1628-1694) foi um cientista e médico italiano famoso por descobrir os capilares do sistema circulatório humano em 1661 e, como o maior anatomista da Revolução Científica, fundou a ciência da anatomia microscópica e embriologia. A Sociedade Real britânica publicava regularmente os trabalhos de Malpighi e o tornou membro em 1668.

Início da Vida

Marcello Malpighi nasceu em 10 de março de 1628, na cidade de Crevalcore, situada na região da Emília-Romanha, na Itália setentrional. Estudou na Universidade de Bolonha, onde recebeu um diploma de médico e, em seguida, um doutorado em filosofia e medicina em 1653. Ele se mudou então para a Universidade de Pisa, onde ocupou o cargo de Professor de Medicina Teórica entre 1656 e 1659. Em Pisa, a carreira futura de Malpighi recebeu influência decisiva das ideias de Giovanni Alfonso Borelli (1608-1679). Membro da mais prestigiosa instituição científica de Florença, a Academia del Cimento, Borelli acreditava que o mundo era mecânico, ou seja, causa e efeito em todas as coisas estavam relacionadas de maneira intrínseca e inteiramente visível. Ele também incutiu em Malpighi a importância do novo método científico, ou seja, testar hipóteses através dos resultados de investigações práticas e sucessivos experimentos.

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A Descoberta dos Capilares

Em 1659, Malpighi retornou à Universidade de Bolonha, que o nomeou Professor de Medicina. Recordando o conselho do seu velho mentor, ele continuou a investigar a anatomia humana, utilizando um instrumento científico relativamente novo: o microscópio. As pesquisas também incluíam a dissecação, bem como a injeção de líquidos coloridos em organismos vivos para melhor compreender fenômenos como a circulação sanguínea. Em 1661, Malpighi publicou a obra Sobre os Pulmões, na qual demonstrou a estrutura dos pulmões humanos e como o sangue circulava através dos capilares pulmonares.

As pesquisas de Malpighi confirmaram sua visão de que o corpo humano era uma máquina maravilhosa.

A descoberta da circulação sanguínea por William Harvey havia ocorrido décadas antes, em 1628. Harvey (1578-1657), um médico inglês, determinou a relação entre o sistema sanguíneo das artérias e veias e as contrações regulares do coração, mas foi Malpighi quem descobriu o importante papel dos capilares nesse sistema circulatório. Os capilares são pequenos vasos sanguíneos que fornecem a ligação crucial entre o sangue oxigenado das pequenas artérias e o sangue que retorna ao coração nas pequenas veias. Ninguém sabia ao certo por que o sangue circulava nesta época e surgiram várias teorias, até que Richard Lower (1631-1691) demonstrou que o sangue é oxigenado nos pulmões e depois bombeado ao redor do corpo pela ação do coração.

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The Scientific Revolution in Europe
A Revolução Científica na Europa
Simeon Netchev (CC BY-NC-ND)

Ovismo e Filosofia Mecanicista

Malpighi continuou a focalizar suas lentes microscópicas em outras áreas do corpo humano que lhe interessavam, como a língua (ele identificou as papilas gustativas), fígado, baço, cérebro e pele. Ele também estudou em detalhes a anatomia do bicho-da-seda, um espécime bem à mão, já que essas criaturas estavam facilmente disponíveis em fazendas de seda e seus corpos são transparentes, o que facilita as observações do funcionamento interno. O cientista publicou suas descobertas em 1669. Malpigui descobriu que, no interior da pupa do bicho-da-seda, era possível vislumbrar, através do microscópio, as asas, pernas e antenas da mariposa que, eventualmente, emergiria do casulo. Isso solucionou um antigo debate sobre como os insetos se transformavam de pupas em criaturas aladas.

O papa Inocêncio XII nomeou Malpighi seu médico oficial em 1691.

Os bichos-da-seda não representavam uma distração dentro da pesquisa geral, já que Malpighi estava convencido de que a ampliação do conhecimento da anatomia dos animais e das estruturas internas das plantas lhe proporcionaria maior compreensão do funcionamento do corpo humano. Por esse motivo, ele estudou sapos dissecados e examinou seus pulmões. Também analisou detalhadamente os embriões de galinha, identificando muitas novas características através do microscópio. Ao fazê-lo, Malpighi tornou-se, com efeito, o fundador de um novo campo de estudo: a embriologia. Este estudo foi publicado em 1673 através da obra Sobre a Formação do Pinto no Ovo. O interesse de Malpighi em obter uma visão geral do maior número possível de formas de vida nem sempre levou à ampliação do seu conhecimento. As pesquisas sobre pupas de insetos, por exemplo, o conduziram ao caminho errado do ovismo - a crença de que um ovo continha todos os materiais necessários para formar uma criatura viva daquela espécie.

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Malpighi's Illustration of a Frog's Lungs
Ilustração de Malpighi dos Pulmões de um Sapo
Wellcome Images (CC BY)

Através das suas pesquisas, Malpighi confirmou sua visão de que o corpo humano consistia numa máquina maravilhosa e, além disso, composto de órgãos (o que ele chamava de glândulas), mecanismos tão intrincados que seu funcionamento só podia ser visualizado por meio de um microscópio. Além disso, o mesmo modelo mecanicista e explicação da vida seria aplicável a todos os organismos vivos. Em cerca ocasião, ele escreveu numa carta:

A Natureza, com o propósito de executar suas maravilhosas operações [que ocorrem] em animais e plantas, satisfez-se em construir seus corpos organizados com um grande número de mecanismos que, por necessidade, são feitos de componentes extremamente pequenos [...] O método da Natureza, então [...] é fazer uso destas pequenas partes, como o sal, filamentos e outros e com estas minúsculas coisas executar cada trabalho [...] Assim como a Natureza merece aplausos e admiração por fabricar mecanismos tão pequenos, assim também os médicos que os observam [...] devem também corrigir e reparar estes mecanismos, tão bem quanto consigam, em cada ocasião que apresentam defeitos. (Moran, 162)

Reconhecimento

A partir de 1662 e por vários anos, Malpighi ensinou medicina na Universidade de Messina, na Sicília e, entre 1666 e 1691, dirigiu uma clínica médica em Bolonha, enquanto prosseguia com suas atividades de cunho acadêmico. Num exemplo do espírito de cooperação internacional que ocorria durante a Revolução Científica, Malpighi publicava regularmente artigos no periódico Philosophical Transactions, a revista não oficial da Sociedade Real, em Londres. O diplomata Henry Oldenburg (c. 1615-1677), que trabalhava como secretário da entidade, teve uma atuação destacada nessa questão. Ele manteve a correspondência entre a instituição e muitos cientistas em toda a Europa, incluindo Malpighi. Certa vez, Oldenburg escreveu ao italiano: "Nossa companhia de filósofos pensa que você está trilhando os caminhos reais que levam a um verdadeiro conhecimento dos segredos da natureza. Você dedica sua mente e mãos a observar com precisão e eviscerar minuciosamente as coisas” (Jardine, 125). Em 1668, Malpighi tornou-se membro da Sociedade Real. Com o passar dos anos, sua reputação cresceu a tal ponto que ele atraiu o interesse do Papa Inocêncio XII (no cargo 1691-1700), que o nomeou seu médico oficial em 1691.

Críticas

Nem sempre, porém, havia mares calmos. Os estudos de Malpighi enfrentaram ataques crescentes de tradicionalistas, desinteressados nas pesquisas com microscópio e defensores da tese de que tais questões estavam dentro dos domínios do divino Criador. De maneira bem clara, para alguns, o funcionamento interno do corpo humano não devia ser uma preocupação da humanidade, já que Deus sabia o que era melhor para todos. Além disso, identificar disfunções ou doenças nos órgãos, por exemplo, sugeria a incapacidade de Deus para a perfeição. As descobertas de Malpighi também desafiavam outros modelos tradicionais sobre o funcionamento do corpo humano; alguns dos quais recuavam até a Antiguidade, como a obra do altamente influente médico grego Galeno (129-216 d.C.).

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Tomb of Malpighi
Túmulo de Malpighi
Luca Borghi (Public Domain)

Malpighi e outros microscopistas também enfrentaram o ceticismo de muitos sobre instrumentos como o microscópio, uma vez que se tratavam de equipamentos notoriamente difíceis de usar naquela época, incluindo a obtenção de imagens claras das lâminas examinadas. Havia suspeitas de que tais instrumentos jamais seriam tão confiáveis quanto o uso exclusivo dos sentidos humanos. Mesmo aqueles que concordavam com o que Malpighi visualizava nas lentes do seu microscópio assinalavam que as novas descobertas não contribuíam para a prática da medicina. Os doutores não estavam inclinados a mudar os métodos tradicionais que usavam para curar e aliviar os sintomas dos pacientes. E não consideravam útil uma nova série de complicações a levar em conta quando lidavam com o corpo humano. Estes ataques não se resumiam à oposição de praticantes da ciência médica e teóricos, que se limitavam a criticar os trabalhos de Malpighi em periódicos acadêmicos. Em 1684, um incêndio atingiu a própria casa do cientista, resultando na perda de instrumentos científicos e da maior parte de seus trabalhos de pesquisa. Felizmente, esta catástrofe não impediu Malpighi de publicar suas obras completas em 1686.

Morte e Legado

Em seus últimos anos em Roma, a elevada reputação de Malpighi rendeu-lhe o título honorário de conde. Também recebeu o convite para integrar a prestigiada Faculdade de Doutores em Medicina. Marcello Malpighi sofreu com problemas de saúde na última parte de sua vida e morreu em Roma, no dia 30 de novembro de 1694. Três anos depois, os manuscritos remanescentes do cientista foram reunidos e publicados pela Sociedade Real.

O nome de Malpighi subsiste em certas características anatômicas do corpo humano, como os Corpúsculos de Malpighi (ou Corpúsculos Renais), descobertos no rim, que atuam como filtros do sangue naquele órgão. A porção mais externa da pele humana é ainda designada como camada malpighiana. Talvez o maior legado do cientista italiano tenha sido o de desafiar as teorias tradicionais e errôneas sobre o funcionamento do corpo humano e o tratamento de problemas de saúde. Personagem de destaque da Revolução Científica, Malpighi defendeu o foco experimental do novo método científico e garantiu que suas descobertas fossem compartilhadas com outros cientistas para que novos avanços pudessem acontecer no futuro.

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Perguntas e respostas

O que Marcello Malpighi descobriu?

Em 1661, Marcello Malpighi descobriu os vasos capilares no sistema circulatório do sangue em humanos.

Como Marcello Malpighi contribuiu para a Revolução Científica?

Marcello Malpighi contribuiu para a Revolução Científica ao privilegiar a experimentação e observação direta para a elaboração de novas teorias sobre o funcionamento interno dos organismos vivos. Ele também acreditava no compartilhamento de seus achados com outros cientistas como, por exemplo, os integrantes da Sociedade Real inglesa.

Sobre o tradutor

Ricardo Albuquerque
Jornalista brasileiro que vive no Rio de Janeiro. Seus principais interesses são a República Romana e os povos da Mesoamérica, entre outros temas.

Sobre o autor

Mark Cartwright
Mark é escritor, pesquisador, historiador e editor. Tem grande interesse por arte, arquitetura e pela busca das ideias que todas as civilizações compartilham. Possui mestrado em Filosofia Política e é Diretor Editorial da WHE.

Citar este trabalho

Estilo APA

Cartwright, M. (2023, outubro 25). Marcello Malpighi [Marcello Malpighi]. (R. Albuquerque, Tradutor). World History Encyclopedia. Recuperado de https://www.worldhistory.org/trans/pt/1-22340/marcello-malpighi/

Estilo Chicago

Cartwright, Mark. "Marcello Malpighi." Traduzido por Ricardo Albuquerque. World History Encyclopedia. Última modificação outubro 25, 2023. https://www.worldhistory.org/trans/pt/1-22340/marcello-malpighi/.

Estilo MLA

Cartwright, Mark. "Marcello Malpighi." Traduzido por Ricardo Albuquerque. World History Encyclopedia. World History Encyclopedia, 25 out 2023, https://www.worldhistory.org/Marcello_Malpighi/. Web. 09 jul 2025.